A deteção do vírus da gripe aviária H5N1 em leite não pasteurizado à venda na Califórnia reforça os alertas das autoridades de saúde sobre os perigos associados ao consumo de leite cru. A descoberta foi feita numa amostra da marca Raw Farm, que não está à venda em Portugal, mas levou ao alerta imediato das autoridades de saúde locais.

Os produtos contaminados foram retirados das prateleiras, mas o Departamento de Saúde Pública da Califórnia apelou aos consumidores para não os consumirem. Embora não haja registo de doenças associadas a este lote, as autoridades sublinham que o leite cru pode ser um veículo para agentes patogénicos, incluindo vírus e bactérias perigosas como a E. coli e a salmonela.

Apesar de não haver registo de infeções em humanos por consumo de leite cru contaminado com o vírus da gripe aviária, os especialistas recomendam cautela.

Questionada pela Lusa, a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) precisou que "a infeção pelo vírus da gripe aviária de alta patogenicidade do subtipo H5N1 em bovinos leiteiros nunca foi detetada fora dos Estados Unidos da América".

A estirpe em causa é a B3.13, que resultou da "recombinação de vírus da estirpe H5N1 euro-asiática com vírus de estirpes americanas que circulavam em aves selvagens".

Este ano, contabilizaram-se, pelo menos, 55 casos de gripe aviária nos EUA, 29 dos quais na Califórnia, sobretudo entre trabalhadores rurais.

Em entrevista à Associated Press, o investigador de doenças infeciosas da Universidade de Minnesota, Michael Osterholm, explica o que se sabe sobre leite não pasteurizado e o vírus da gripe aviária H5N1.

A gripe aviária, também conhecida como gripe das aves ou tipo A H5N1, foi confirmada pela primeira vez no gado leiteiro dos EUA em março, nos porcos em outubro, nos ovose agora no leite. Na Califórnia, mais de 435 rebanhos leiteiros tiveram infeções – mais do que todos os outros estados dos EUA juntos. E foram encontrados níveis elevados do vírus no leite de vacas infetadas.

Cerca de 20% das amostras de leite pasteurizado vendidas nas lojas continham restos virais do vírus, de acordo com testes realizados no início deste ano por cientistas da agência governamental Food and Drug Administration.

A pasteurização mata o vírus da gripe aviária e também bactérias como a E. coli, a listeria e a salmonela, que são transmissíveis aos humanos e podem adoecer.

O Departamento de Alimentação e Agricultura da Califórnia têm realizado testes semanais ao leite cru em tanques das fábricas de laticínios do estado.

Foram realizados poucos testes de produtos lácteos não pasteurizados vendidos em lojas, pelo que é possível que outros produtos lácteos crus possam conter o vírus, segundo Osterholm.

O consumo de leite cru com H5N1 pode infetar humanos?

Até agora, não há provas de que humanos tenham contraído o vírus H5N1 através do consumo de leite cru. Nos EUA, este ano, registaram-se 55 casos de infeção por gripe aviária em humanos, maioritariamente entre trabalhadores agrícolas que tiveram contacto direto com animais infetados que desenvolveram doença ligeira.

Apesar disso, estudos mostram que o consumo de leite cru contaminado pode representar um perigo.

Testes realizados em ratos alimentados com leite cru contaminado com o vírus da gripe aviária ficaram muito doentes e gatos de quintas que beberam leite de vacas infetadas sofreram danos cerebrais e morreram, disse à AP Nicole Martin, microbiologista e diretora associada do Programa de Melhoria da Qualidade do Leite da Universidade de Cornell.

“Ainda não sabemos se as pessoas podem contrair o H5N1 através do consumo de leite cru, mas temos provas suficientes que sugerem que precisamos de ser mais cautelosos neste momento”, alertou.

O que dizem os especialistas sobre o leite não pasteurizado?

As autoridades de saúde alertam há anos que o leite não pasteurizado pode causar infeções graves ou mesmo fatais.

Entre 1998 e 2018, os Centros de Controlo e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) documentaram mais de 200 surtos de doenças atribuídos ao leite cru, em que adoeceram mais de 2.600 pessoas e mais de 225 tiveram de ser hospitalizadas.

Antes de os EUA adotarem normas de segurança em 1924 ao abrigo da chamada Portaria do Leite Pasteurizado, cerca de 25% das doenças de origem alimentar estavam relacionadas com o consumo de lacticínios, de acordo com o Center for Dairy Research. Hoje em dia, os produtos lácteos são responsáveis ​​por cerca de 1% destas doenças.

Os especialistas reforçam que o consumo de leite pasteurizado é a forma mais segura de aproveitar os benefícios dos produtos lácteos sem colocar a saúde em risco.