
"É a primeira vez que entro. Sou da costa, já vi faróis, mas nunca tinha subido a um. É uma boa experiência: há boas vistas lá em cima e está muito bem cuidado", descreve à Lusa, ao descer a torre do farol D. Maria Pia, o primeiro do arquipélago, construído há 144 anos.
Encontrou a sugestão na Internet como novo ponto de referência nos passeios pela capital, um local aberto a visitantes há poucas semanas, no âmbito do projeto de recuperação dos oito faróis históricos do arquipélago -- os mais ocidentais de África, no meio do oceano Atlântico.
"Estavam muito degradados, apesar de estarem em funcionamento", descreve Nireide Tavares, coordenadora do projeto no Instituto do Património Cultural (IPC), com apoio da Cooperação Espanhola.
O objetivo é "recuperar os espaços e convertê-los em recursos turísticos e culturais, ou seja, não é só fazer manutenção, mas dar vida".
Três dos faróis em locais mais acessíveis, além de terem sido requalificados, ganharam zonas interpretativas, espaços onde foram colocados painéis com notas explicativas, mapas, vídeos e até algumas peças antigas.
São os casos dos faróis de São José (ilha do Maio) e de Fontes Pereira de Melo (ilha de Santo Antão), além daquele que se ergue face à cidade da Praia.
O farol D. Maria Pia é um dos ícones da capital cabo-verdiana, com um portão bem visível a quem passeia a pé pela ventosa Ponta Temerosa -- nome que se julga fazer justiça à quantidade de rochedos que rodeiam esta entrada na baía portuária.
A antiga "gaiola" de iluminação, que estava no cimo da torre de 25 metros, foi recuperada e agora dá guarida à receção, no pátio principal, onde 200 escudos (pouco menos de dois euros) dão acesso a todo o recinto -- começando pela área em redor da torre.
Um recinto que as autoridades esperam vir a concessionar a terceiros, num processo em estudo, para dinamizar a oferta.
Neste pátio estão dois canhões originais apontados para o mar e que faziam parte da bateria de três que guardava a entrada no porto contra piratas e corsários, mesmo antes de se construir o farol.
Agora, "foi a primeira vez que se fez um trabalho minucioso de restauro", explica Nireide, ao detalhar os cuidados para tirar a corrosão e dar nova vida às peças de artilharia, que na altura eram recuperadas de naufrágios para funções de defesa.
No interior, contextualiza-se a necessidade que havia no século de XIX de iluminar a costa, com cópias de mapas, documentos históricos e antigas óticas do farol, património do Instituto Marítimo e Portuário (IMP) de Cabo Verde, parceiro do projeto.
A escadaria em caracol atrai os visitantes que podem subir até ao primeiro andar, onde há uma larga varanda equipada com binóculos fixos, que permite ver parte da cidade ao detalhe.
Nireide Tavares explica que há outro objetivo: "a sustentabilidade do projeto".
Pretende-se que haja receitas, com bilheteira e parcerias com outras entidades, que permitam cobrir os trabalhos de manutenção do recinto, exposto sempre a elementos agressivos (água, sal, sol e vento).
"Houve uma primeira intervenção em 2017 e 2018, que não terminou e que agora teve continuidade. Houve um levantamento minucioso, porque se trata de uma recuperação patrimonial", referiu, para mostrar o valor do trabalho concretizado no farol D. Maria Pia, assim como nos outros oito edifícios históricos e que agora se pretende preservar.
Além dos três faróis que ganharam centros de interpretação, o projeto inclui os faróis D. Luís, D. Amélia (ambos na ilha de São Vicente), Morro Negro (ilha da Boa Vista), Ponta Negra e farol de Leste (ilha de Santiago).
Na cidade da Praia, José Maria, turista espanhol acompanhado pela mulher, terminou a sua primeira visita a um farol.
Em pouco menos de meia-hora, pelo menos outros dois casais fazem o mesmo percurso, transformando um espaço degradado na atração que tem uma das melhores vistas para a cidade -- enquanto à noite os feixes de luz (agora automáticos) continuam a auxiliar a navegação.
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