A pergunta para um milhão de euros na Milão-Sanremo, o primeiro Monumento da temporada, no sábado, é óbvia e não é nova: será que Tadej Pogacar vencerá, enfim, a ‘Classíssima’, à quinta tentativa consecutiva?   

O melhor corredor do mundo, que praticamente vence todas as provas em que participa, já admitiu que conquistar a clássica italiana se tornou uma obsessão. Pogacar já ganhou três dos cinco monumentos: a Volta à Lombardia por quatro vezes, Liège-Bastogne-Liège duas e a Volta à Flandres numa ocasião; também venceu aquele que é considerado o sexto monumento, a Strade Bianche, três vezes. Falta a Paris-Roubaix, em que ainda não se estreou (pondera fazê-lo este ano, mas decidirá mais tarde), e a Milão-Sanremo.  

«A Milão-Sanremo é uma corrida que poderá ir comigo para o túmulo... Estou tão perto, mas estou tão longe de a ganhar. É inacreditável», admitiu Pogacar ao podcaster Peter Attia durante a pré-temporada, e concordando com o que se tornou tradição dizer-se sobre a ‘Primavera’, a mais longa corrida de um dia do calendário do WorldTour, com 289 km: ‘o Monumento mais fácil de terminar, mas o mais difícil de vencer’.

Pogacar é ainda campeão mundial em título, mas também aqui a história corre contra ele. O detentor da camisola arco-íris raramente é o vencedor. Em 106 edições, apenas cinco corredores que a envergavam venceram, tendo sido o italiano Guiseppe Saronni o último, em 1983. 

«Pode perder-se a Milão-Sanremo a cada decisão que se toma, e só a decisão certa nos mantém na corrida pela vitória», disse Tom Pidcock (Q36.5) ao Cyclingnews durante a recente Tirreno-Adriático. O britânico referia-se a imprevisibilidade que se enfrenta nos derradeiros 27 quilómetros, desde o sopé da Cipressa até ao risco de meta na celébre Via Roma de Sanremo.        

Pogacar e a UAE Emirates já tentaram várias estratégias, mas nenhuma teve êxito. Todavia, também nenhuma foi executada com perfeição. Porque só uma corrida perfeita poderá levar o esloveno a levantar os braços. Mas Pogi e a sua equipa vão voltar a tentar.

Pogacar só poderá vencer se se isolar ou se discutir a vitória com adversário(s) menos rápidos do que ele no sprint. E ambas as tarefas são hercúleas. Será bastante difícil descartar velocistas como o vencedor em 2024, Jasper Philipsen (Alpecin-Deceuninck), Mads Pedersen (Lidl-Trek) ou o segundo classificado no ano passado, Michael Matthews (Jayco AlUla), e outros corredores mais explosivos numa chegada veloz, como o segundo posicionado em 2023, Filippo Ganna (Ineos Grenadiers), ou o primeiro nesse ano, Mathieu van der Poel (Alpecin-Deceuninck), quinteto que se perfila como o seu principal oponente na edição de 2025.

Tadej Pogacar precisa que a corrida vá num ritmo alto na subida de Turchino (cujo cume aos 138 km, está a 151 km ainda da meta!), depois manter alta velocidade no traçado longo da costa, subir a fundo a Cipressa com a sua equipa, para fazer a diferença com um ataque no Poggio (cume a 5 km da chegada). Nenhum daqueles poderá resistir-lhe, mas vão tentar tudo para fazê-lo, aproveitando-se da necessidade de Pogacar e a sua equipa terem de suportar as despesas da corrida nessa fase. 

A tática perfeita é quase unanimemente conhecida e aceite: olhando-se à equipa que o esloveno terá ao seu serviço, o veterano rolador norueguês Vergar Stake Laengen, este ano promovido ao septeto, e o compatriota de Pogacar, Domen Novak, terão a longa e extenuante tarefa levar o pelotão a um ritmo alto durante 235 km (!) até ao primeiro dos três Capo, Mele. Aqui deverá entrar em ação o alemão Nils Pollit, para fazer a primeira seleção de gregários das equipas dos sprinters, com o onbjetico de não os poderem ajudar na Cipressa e principalmente na ligação ao Poggio, as duas subidas em que a UAE Emirates tem de ser... perfeita.  

Perfeita, primeiro, em coesão, para entrar em bloco na dianteira do pelotão no batalhado acesso à Cipressa (5,6 km a 4,1%). Serão, pelo menos, três os elementos com Pogacar, que não podem ter atrasos ou mau posicionamento, como sucedeu em 2024.  

Tim Wellens, Isaac Del Toro (que substitui Brandon McNulty, que esteve doentes há dias e foi forçado a desistir na Paris-Nice) e Jhonathan Narvaez, em revezamento, antes de Pogacar atacar para se isolar ou levar o menor número de adversários possível para a descida e ligação plana ao Poggio (esta última de 10 km).

Se Pogacar se isolar, não precisará de companheiros, mas se passarem alguns dos referidos rivais (ou todos), o esloveno tem de contar que terá de trabalhar (muito) mais do que estes. Por isso, o plano poderá passar pelo adiamento do ataque de Pogi para o Poggio, preservando assim pelo menos um elemento consigo na transição.     

«Gostaria de dar-lhe [a Pogacar] algumas dicas sobre como fazer, mas só lhe desejo boa sorte...», disse o vencedor da edição de 2017, o polaco Michał Kwiatkowski (Ineos), ao Cyclingnews, que estará ausente por lesão. 

«Para ganhar grandes corridas, adaptas as tuas táticas e tentas tirar vantagem quando os corredores estão sob pressão para ganhar. Foi o que fiz em 2017. Eu sabia que o Peter Sagan estava desesperado para ganhar e por isso obriguei-o a arrastar-nos até à meta. É preciso sempre usar pequenos, mas importantes, detalhes como este. É preciso ser inteligente para vencer a Milão-Sanremo», explicou Kwiato. 

Pogacar subiu a Cipressa em 9.35 minutos em 2024. O tempo estimado como ideal (ou indispensável) para que Pogacar possa atacar e fazer a diferença são 9 minutos (!), que bateria o recorde de Gabriele Colombo (9.19) de 1996, quando atacou, acompanhado por Max Sciandri, Alexander Gontchenkov e Michele Coppolillo, e depois escapou no quilómetro final para vencer isolado. 

«Não diria que é um objetivo, mas já nos rimos ao dizer que faremos a Cipressa em menos de nove minutos», afirmou Tim Wellens em janeiro durante o estágio da equipa. «O ano passado foi um exemplo de que nem tudo poderá correr como planeado», assumiu o belga. 

A Cipressa termina a 21,7 km da chegada. Se a Emirates estabelecesse um ritmo suficientemente rápido para nove minutos antes de Pogacar atacar perto do cume, alguém ousaria responder ao campeão do mundo? Certamente que Mads Pedersen, Filippo Ganna, Mathieu van der Poel ou Tom Pidcock não enjeitariam a oportunidade de agarrar-lhe a roda. Porque o que se segue poderá ser curto para a apanhar um corredor tão forte e habituado a esforços em solitário como Pogacar – e porque o entendimento na perseguição nunca será... perfeito. 

Depois da descida rápida, o regresso à estrada costeira, para a ligação ao Poggio, é ideal para uma perseguição, mas só se as equipas com líder que se atrase tiverem elementos de trabalho capazes de anular a fuga. Porque se Pogacar chega isola àquela derradeira subida, será muito difícil alcançá-lo até à meta.  

«O vento é fundamental. As pessoas que assistem em casa não conseguem sentir o vento na estrada, mas é um fator vital nas corridas. Um ataque ao Cipressa com vento contrário é inútil, porque também soprará de cara no terreno plano em direção ao Poggio», explicou Max Sciandri ao Cyclingnews.

Roladores fortes podem apanhar os atacantes, se estes não foram também roladores e tão ou mais fortes, como Pogacar, Ganna, Van der Poel ou Pedersen. «Atacar na Cipressa seria uma grande aposta para Pogacar, mas não teria garantias de que resultaria até final. É arriscado. Não pode esgotar a sua equipa na Cipressa como fez em 2024, porque precisa deles para o Poggio, quando é quase certo que será lá que os ataques decisivos ocorrerão», anteviu Sciandri, citado pelo mesmo site.

Por seu turno, Caleb Ewan (Ineos Grenadiers) sabe que, como velocista, tem de sobreviver nas subidas com companheiros de equipa para o ajudarem a recuperar e depois tentar impor na meta a superior velocidade terminal. Por isso, o australiano aconselha Pogacar a adotar uma tática diferente, a concentrar todos os esforços, e os da sua equipa, no Poggio. 

«Toda a gente sabe que ele vai tentar alguma coisa, por isso todos estarão prontos. O erro que Pogacar tem cometido, creio, é que esgota praticamente toda a a equipa na Cipressa e não tem elementos suficientes para manter a intensidade na ligação ao Poggio e para endurecer o ritmo nesta subida desde o seu começo», explica Ewan.