Destacados em Leiria e com a missão de cobrir a Final Four da Allianz Cup, o zerozero seguiu de perto ambas as meias-finais que se realizaram no Estádio Dr. Magalhães Pereira. Leões e águias superiorizaram-se a dragões e gverreiros e marcaram encontro no próximo sábado, dia 11 de janeiro.
Um dérbi lisboeta, entre Sporting e Benfica, é o que nos reserva a final da Allianz Cup. Para tentar perceber a importância deste reencontro, além da disputa do troféu, o nosso portal embarcou pelos meandros da sua base de dados para chegar a um nome com o qual fizesse sentido falar sobre tal tópico.
Não lhe queremos mentir, caro leitor. A pesquisa foi bastante rápida porque nos lembrámos de um dos protagonistas do momento mais marcante entre estes dois clubes em tal competição: Pedro Silva! Quem não se lembra daquela «mão fantasma», a «peitaça» e a medalha a voar? Ei-lo, em exclusivo ao zerozero!
«Disse-me que em caso de dúvida era obrigado a marcar»
zerozero (zz): 21 de março de 2009. Final da Taça da Liga frente ao Benfica. Como se sente em relação a essa memória ao dia de hoje?
Pedro Silva (PS): «Não tem como esquecer. Sempre que acontece uma final ou algum jogo entre Sporting e Benfica... vai ficar na memória para sempre!»
zz: Aquele lance está perdoado?
PS: «Está perdoado, sim. Cheguei a encontrar-me com ele quando estava no Portimonense como adjunto. Encontrei-o num jogo frente ao Atletico CP e ele veio-me pedir desculpa pelo erro. Acontece, todos erramos... mas é normal que fique triste e chateado por ter resultado numa derrota. Trabalhas uma época inteira, chegas à final para colocar em prática tudo o que trabalhaste e de repente tudo desaparece com um simples erro. Prejudicou-me porque perdi um troféu, fui expulso e acabei por cometer alguns erros nas entrevistas após o jogo com o calor do jogo.»
zz: E essa conversa quando se voltaram a encontrar foi bem mais calma, certo?
PS: «Vou-te dizer, não foi assim tão tranquila [risos].»
zz: Então?
PS: «Estava na porta do balneário a conversar com o investidor do Portimonense e o Lucílio chegou e perguntou se podia falar comigo para explicar o que tinha acontecido.»
zz: Isso foi em que ano?
PS: «2014 ou 2015»
zz: E foi a primeira vez que falou com ele desde o lance?
PS: «Foi a primeira vez, sim. Eu percebi o que ele me disse. Explicou-me que tinha uns segundos para decidir um lance tão difícil e que, na verdade, tinha sido o fiscal de linha a ver o lance e a assinalar grande penalidade. Eu disse-lhe na altura "Vais ver o lance depois do jogo e vais ver que cometeste um erro gravíssimo" e que podia corrigir esse erro não assinalando o penálti. Ele aí respondeu-me uma coisa que eu nem sei descrever... disse-me que na dúvida era obrigado a marcar. Então como estava na dúvida... marcou.»
zz: Era obrigado a marcar?
PS: «Pois... [risos]. Ele só me disse que na dúvida tinha de marcar penálti. Não sei porque me disse isso, mas na dúvida tinha de marcar grande penalidade.»
zz: Custa ouvir isso?
PS: «Custa muito. Estava com alguns colegas ao lado que também eram adeptos do Sporting e disseram-lhe mesmo "Tu tiraste-nos um título". Se tinha poucos segundos para decidir e estava na dúvida, por que não deixar jogar em vez de marcar penálti?»
«Fui para cima dele para o agredir»
zz: O que é que lhe passou pela cabeça quando ele lhe mostrou o cartão vermelho?
PS: «Vou ser muito honesto. Eu fui para cima dele para o agredir, mas ali nos últimos segundos decidi só empurrar com o peito. Eu nem tinha ouvido o apito dele. Dominei logo a bola e quando olhei para a frente é que vi os meus colegas a correr para cima dele e ela a apontar para a marca de grande penalidade. Aí foi quando fui até ele e lhe disse que ia ver depois do jogo que tinha cometido um erro e que nos ia tirar um troféu assim.»
zz: Ele disse alguma coisa? Lembra-se?
PS: «Quando fui lá naquele gesto de o empurrar ele disse-me: "Se estou a cometer um erro, você também está ao agredir um árbitro". Eu na altura disse-lhe: "Não agredi, só empurrei".»
zz: Deve ter sido difícil gerir tudo isso.
PS: «Sim, eu nem lhe quero chamar pressão, mas os adeptos ali a quererem ganhar um troféu porque a nossa fase não era a melhor... são erros que ficam muito marcados. Até hoje quando vou a Portugal, tenho muitos amigos benfiquistas infelizmente [risos] que se metem na brincadeira comigo»
zz: Quando os ânimos acalmaram, esse lance deve ter virado piada entre alguns colegas.
PS: «Sim, sim, completamente. Mantenho amizade com alguns atletas da altura, como o Luisão.»
zz: Ele mete-se consigo por causa disso?
PS: [risos] «Já estive na casa dele e claro, brincámos sobre isso. Rolam sempre umas brincadeiras, mas sempre com respeito. Nós morávamos muito perto e as nossas famílias davam-se muito bem. Era uma amizade bem legal.»
zz: Voltando ao lance novamente. As imagens permitiram-nos ver os momentos do lance, em que recebe o cartão, a reação com o árbitro e a saída do campo. E depois? Como foi o que as câmaras não apanham?
PS: «No balneário foi muito difícil. Muita tristeza. O meu telemóvel começou logo a tocar com a minha família a ligar, a minha esposa e alguns amigos a pedirem para eu me acalmar. Lembro-me que veio o Paulinho também acalmar-me e pedir para eu ter calma.»
zz: O Paulinho que tem a sua medalha, não é?
PS: «O Paulinho tem a medalha até hoje.»
zz: Não quer a medalha?
PS: «Não, e nem é pela questão de ter perdido porque isso é normal no futebol. Na hora de receber a medalha, disse ao Presidente da Federação ou da arbitragem [o nosso portal não conseguiu confirmar] que devia estar a receber a outra medalha e que merecia receber a de campeão. Ele respondeu-me: "Tens de saber perder, perdeste por isso tens de ficar com esta". E foi aí que me revoltei e atirei a medalha. Trabalhamos uma época inteira e depois somos prejudicados assim.»
zz: Sentia que era um título importante para o grupo?
PS: «Muito importante e estávamos muito confiantes.»
zz: Tinham ganho 4-1 ao FC Porto no jogo anterior.
PS: «4-1 ao FC Porto em casa e estávamos muito confiantes. Chegamos ao estádio a dizer: "É hoje! Temos de ganhar, não dá para fugir. Não podemos perder esse dérbi. Estádio cheio... temos de levar o troféu para casa". E depois foi só tristeza.»
zz: O Paulo Bento falou consigo na altura?
PS: «Falou no dia seguinte. Fui pedir-lhe desculpa pela expulsão, por ter empurrado e pelas coisas ditas no pós-jogo e ele disse-me: "Não, tu estás certo. Fizeste bem porque esse erro acabou por nos tirar o troféu". Ele apoiou-me muito, era muito parceiro dos jogadores e tenho um carinho enorme por ele. Aquele lance também o prejudicou. Se existisse VAR naquela altura, a história era outra.»
zz: A viagem de regresso depois deve ter sido dolorosa. Quem foram as vozes que o acalmaram e falaram com o grupo naquele momento?
PS: «O Paulo Bento, o Rochemback também falou, somos muito próximos, e o João Moutinho que nos disse para termos cuidado com o que dizíamos nas entrevistas, que os jogadores do Benfica não tinham culpa nenhuma daquele erro e para respeitarmos a vitória deles. A viagem foi feita em silêncio total depois. Nos dias seguintes andávamos na rua e no shopping e as provocações das pessoas eram constantes.»
«Aimar e Di María? Dois jogadores inacreditáveis»
zz: Voltando ao jogo. Lembra-se como recebe o primeiro amarelo?
PS: [risos] «Falta em cima do Pablo Aimar.»
zz: Exatamente, era craque?
PS: «Demais... Era espetacular. Lembro-me que antes do jogo eu e ele já estávamos picados. Já estávamos a discutir no túnel [risos]»
zz: O que se passou?
PS: «O Rochemback também estava metido ao barulho. Se vires as imagens do jogo vês que há alguns momentos em que eu e ele estamos a discutir, ou ele a empurrar-me, ou eu a ele. No túnel o Aimar passou por mim e esbarrou comigo. Eu entendi aquilo como uma provocação, fui lá e empurrei-o. O Quique Flores veio e pediu para acalmar as coisas e disse que se começávamos logo ali o dérbi nem se ia realizar.»
zz: E o Rochemback?
PS: «Veio ao meu ouvido e disse-me: "Deixa estar que eu trato dele". E então no jogo combinámos assim, ora pegava um, ora pegava o outro [risos].»
zz: Por falar em argentinos, o lance do penálti é com o único jogador desse encontro que se encontra num dos clubes hoje: Ángel Di María.
PS: «O Di María é um dos maiores de todos os tempos. Ele não teve culpa ali, eu estava chateado era com o Lucílio [risos]. Aquela época foi quando ele começou a explodir, é um jogador espetacular.»
zz: O que fazia dele tão diferente? Ao ponto de ainda hoje ser uma das figuras do Benfica.
PS: «A mudança de direção, o controlo de bola, o drible rápido... tinha um improviso muito fácil. Achavas que ele ia levar a bola para a linha de fundo para cruzar e cortava para dentro. Outras vezes cortava para fora... era muito difícil marcar um jogador assim.»
zz: E na altura não lhe pediu para ele dizer ao árbitro que não era penálti? Ou a outro jogador?
PS: [risos] «Fomos todos para cima do Lucílio, era difícil alguém do Benfica assumir que não era mão. Um dérbi, uma final... é quase impossível. Eu não sei se teria coragem de chegar ao pé do árbitro e dizer: "Não foi penálti". É uma rivalidade muito grande. O único jogador com quem conversei foi o Luisão. Na altura da premiação disse-lhe que a bola não tinha ido ao braço, mas sim ao peito. Foi ele o único.»
zz: E agora? Sporting-Benfica no próximo sábado, diz 11 de janeiro. Vai estar atento?
PS: «Claro! Vou para Portugal uns dias depois, mas os meus amigos benfiquistas queriam que antecipasse o voo para estar na final. Já lhes disse que lá estarei uns dias depois para festejar a vitória do meu Sporting!»