"Muita gente pensa que isto é uma questão estética, mas o que mais desejo é ganhar saúde. Já fiz muito cuidado com a alimentação, mas faltou-me sempre conciliar com o exercício físico. Tive altos e baixos, muita luta. Isto vai ser um renascer. É a mudança da Ana Vitória", diz a paciente.

Com 104 quilos, um histórico familiar de cancro do estômago e muitas dores devido ao excesso de peso e por trabalhar em pé o dia todo numa unidade fabril automóvel, Ana entregou-se nas mãos do cirurgião Gil Faria, responsável por mais de 100 cirurgias bariátricas em regime de ambulatório e autor da 'koala sleeve', uma técnica única no mundo que foi apresentada em maio de 2024 no Congresso Europeu de Cirurgia de Obesidade em Viena, na Áustria.

Em entrevista à agência Lusa, na véspera do Dia Mundial da Obesidade, o médico que coordena a Unidade de Tratamento Cirúrgico de Obesidade da Unidade Local de Saúde de Matosinhos (ULSM) explica no que é que a 'koala sleeve' é diferente do praticado até aqui e alerta para a necessidade de se deixar de olhar para a obesidade como "a doença dos mal comportados".

"É importante quebrar preconceitos. A ideia de que as pessoas com obesidade têm a doença porque são preguiçosas ou gulosas não é verdade. Esta é uma doença multifatorial com componentes genéticos, ambientais, comportamentais e psicológicos. Em Portugal, sabemos que cerca 25% da população tem obesidade", analisa.

Para combater esta doença, são feitos, anualmente, mais de 500 mil 'sleeves' gástricos no mundo inteiro.

O 'sleeve' -- gastrectomia vertical ou cirurgia de redução do estômago -- consiste na remoção de cerca de 70% do estômago fazendo com que este, em vez de se parecer com um saco que armazena comia, fique como uma banana, um tubo estreito.

Segundo Gil Faria, um dos principais problemas é o risco de refluxo após a cirurgia, o risco dos conteúdos do estômago regressarem ao esófago, causando azia e ardência.

Têm havido várias técnicas para tentar controlar o refluxo gastroesofágico após o 'sleeve' e todas implicam deixar uma parte extra do estômago para formar uma espécie de gravata à volta.

"Isso pode comprometer a perda de peso. O que queremos fazer [com uma nova técnica inovadora] é um 'sleeve' gástrico completo, associando-lhe uma manobra anti-refluxo", explica.

Na prática, a 'koala sleeve' consiste na adaptação do 'sleeve' tradicional, acrescentando-lhe uma espécie de válvula que tenta impedir o refluxo dos alimentos do estômago para o esófago.

O objetivo é que sintomas como a regurgitação e a ardência desapareçam e o paciente não precise de tomar medicação de controlo.

"E, no limite, não precisa de fazer outras técnicas cirúrgicas mais agressivas como um bypass", aponta o médico que publicou a técnica, em janeiro, na revista Surgical Endoscopy And Other Interventional Techniques e já a aplicou a pelo menos 15 doentes no Hospital Pedro Hispano.

"Os resultados preliminares indicam que a taxa de controlo do refluxo é de quase 90%", acrescenta.

Mãe de duas meninas (23 e 15 anos) que, conta à Lusa, "estão muito orgulhosas da coragem de todo este processo", Ana Vitória sabe que após esta intervenção "a luta continuará", mantendo as idas diárias ao ginásio onde até aulas de cycling de 45 minutos já faz.

"Eu estava no meu limite. Tem de ser. Esta é a primeira intervenção cirúrgica que faço para perder peso e será a primeira e única, porque o doutor Gil dar-me-á uma ferramenta muito boa que eu vou tratar muito bem", garante.

 Paula Fernandes Teixeira (texto), José Coelho (fotos) e André Sá (vídeo), da agência Lusa

 

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