Segundo os dados mais recentes do SICAD, os jovens entre os 13 e os 18 anos consomem hoje menos álcool e drogas ilícitas, tendência que, à vista, parece positiva. No entanto, a redução naqueles que veríamos como consumos tradicionais está a ser substituída por novos comportamentos de risco. Têm aumentado as apostas a dinheiro e a participação em jogos de fortuna e azar, muitas vezes em plataformas ilegais e sem qualquer controlo parental. De onde vem este fascínio pelo jogo online? A resposta é desconfortavelmente óbvia: está por todo o lado.

Atualmente, o jogo a dinheiro entre os alunos distribui-se por várias modalidades. Ao contrário do que acontecia anteriormente, quando se concentrava maioritariamente nas apostas desportivas. Nos últimos 12 meses, segundo um estudo da ECATD-CAD, aplicado a alunos do ensino publico português entre os 13-18 anos, o jogo a dinheiro tornou-se mais recorrente, sobretudo nesta faixa etária. Em comparação com 2019, há menos jogadores a participar em apostas desportivas, mas verifica-se um aumento no jogo de cartas a dinheiro como na utilização de slot machines.

Face a 2019, o jogo a dinheiro triplicou entre os alunos de 13 anos e duplicou nos de 14, o que indica uma iniciação cada vez mais precoce a comportamentos de risco. Embora os valores mais altos continuem a verificar-se entre os 17 e 18 anos, é a subida nas idades mais jovens que mais se destaca e levanta preocupações a longo prazo.

Apesar de uma maior consciencialização pública sobre os riscos associados às novas tecnologias, em particular à participação nas redes sociais digitais, o jogo eletrónico continua a aumentar.

Curioso que este estudo, que incide sobre jovens entre os 13 e os 18 anos, revela ainda que nos 12 meses anteriores, os jovens de 16 anos lideram a percentagem do jogo a dinheiro “de forma problemática”, com valores acima dos registados entre jovens com 18 anos.

A indústria do jogo infiltra-se subtilmente na vida dos mais jovens através de patrocínios, publicidade e influencers. As três maiores equipas de futebol portuguesas têm atualmente contratos com plataformas de apostas, normalizando o jogo como parte da cultura desportiva.

Na rede social X encontramos, com frequência, publicações promovidas por sites de apostas ou de investimento em criptomoedas, muitas vezes associadas a esquemas de pirâmide financeira, disfarçados de inovação digital.

No YouTube, no Instagram, no TikTok, não existem portos seguros. Influencers e youtubers com audiências predominantemente jovens fazem publicidade direta ao jogo online, promovendo códigos de desconto e promessas de lucro fácil.

Mas a sedução não está apenas no jogo em si, está no pacote completo: o estilo de vida. A mansão, o carro de luxo, a promessa de independência financeira e o poder. Para muitos adolescentes, tudo isto surge como uma narrativa coerente, onde o dinheiro fácil se mistura com uma visão distorcida de sucesso e masculinidade.

É aqui que figuras como Andrew Tate entram em cena. Embora operem em contextos diferentes, influencers como o referido ou até nomes nacionais como o Numeiro partilham uma fórmula semelhante: promovem o jogo online como uma via rápida para o enriquecimento e, ao mesmo tempo, vendem uma imagem de masculinidade tóxica, quase sempre construída sobre a exclusão da mulher na sociedade.

O fascínio pelo jogo já não é apenas uma questão de entretenimento ou risco: é parte de um estilo de vida aspiracional, onde o valor do homem se mede em poder, ostentação e controlo.

A associação entre o jogo e este tipo de mentalidade é perigosa. Estamos a permitir que uma geração cresça a acreditar que a validação vem do lucro fácil e da dominação. A pergunta, então, já não é de onde vem o fascínio dos jovens pelo jogo a dinheiro, mas sim: como é que ainda não fizemos nada para travar esta cultura que o alimenta?