Sete anos depois dos incêndios que deixaram Pedrógão Grande e todo o país de luto, foi esse o palco escolhido para Marcelo Rebelo de Sousa honrar os portugueses no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades. Mas o discurso focado na capacidade deste povo de responder à adversidade e construir um futuro inclusivo de nacionais e estrangeiros, porque "Portugal é só um e o mesmo Portugal", conforme declarou o Presidente da República, não chegou aos ouvidos dos antigos combatentes portugueses.
Reunidos em Belém, onde tradicionalmente se juntam neste dia, junto ao monumento erguido em homenagem àqueles que caíram na Guerra Colonial, os ex-combatentes honraram os mortos e os vivos e o papel de ambos na História de Portugal. Dispensando não apenas a presença do Presidente da República mas qualquer mensagem que o chefe do Estado ali pudesse deixar.
Ao contrário do que sempre aconteceu, desta vez os ex-combatentes rejeitaram ativamente a mensagem do Presidente. E vincaram-no numa declaração lida no início da cerimónia de comemoração do 10 de Junho dos Combatentes.
A razão? As recentes declarações de Marcelo sobre o dever de "reparação histórica" de Portugal às ex-Colónias, que aqueles que empunharam armas para defender o então território nacional, em nome próprio e dos que morreram na Guerra do Ultramar, consideraram ofensivo e desrespeitoso. É "uma afronta a todos aqueles que se bateram por Portugal nos então territórios ultramarinos e à sua memória", afirmam, sublinhando ainda a desonra do Presidente à própria História de Portugal.
"A Comissão Promotora para a Homenagem Nacional aos combatentes que hoje, Dia de Camões e das Comunidades, se realiza, tendo presente as declarações de Sua Ex.ª o Presidente da República acerca do passado histórico de Portugal, em especial sobre o ex-Ultramar, considerando-as uma afronta a todos aqueles que se bateram por Portugal nos então territórios ultramarinos e à sua memória, e também à História de Portugal, que a todos orgulha, deliberou por unanimidade não solicitar a tradicional mensagem presidencial para ser lida nesta cerimónia", ouviu-se frente ao Monumento aos Combatentes da Guerra Colonial, mesmo no arranque da cerimónia do 10 de Junho.
"Não podemos pôr para debaixo do tapete as reparações às ex-colónias", afirmara o Presidente, numa conversa com jornalistas estrangeiros, em vésperas do 25 de Abril. Nesse encontro, Marcelo disse mesmo que Portugal devia "pagar os custos" do seu colonialismo e sublinhou: "Há ações que não foram punidas e os responsáveis não foram presos? Há bens que foram saqueados e não foram devolvidos? Vamos ver como podemos reparar isto."
As declarações foram amplamente debatidas, mas de todo se gerou sobre essa ideia consenso nacional, tendo sido muito mais os que a rejeitaram do que os que nela viram alguma razão. Mas os ex-combatentes, que lutaram na Guerra Colonial, sentiram-se particularmente feridos por essas palavras do Presidente da República e fizeram questão de o declarar hoje, Dia de Portugal.
"Os combatentes são filhos de boa gente", frisaram na nota inicial, vincando a posição coletiva.