Poucas vezes a Cultura é notícia e ainda menos o é por motivos positivos, como aconteceu quando a então tutelar da pasta Graça Fonseca anunciou o acesso gratuito anual a museus, palácios e teatros nacionais para jovens de 18 anos, em 2018, ou, já na presente legislatura, a atual ministra, Dalila Rodrigues, anunciou 52 entradas livres por ano nos 37 museus e monumentos de tutela pública para todos os portugueses e residentes em Portugal.

E na última semana, o que tem sido debatido, levando mesmo à aprovação de uma audição da ministra na Comissão de Cultura no Parlamento, é a substituição de Francisca Carneiro Fernandes na liderança do CCB. Dalila Rodrigues tem sido acusada pelo setor e criticada pela oposição partidária de ter motivações meramente políticas para a mudança, que aconteceu na véspera de se cumprir um ano sobre a nomeação daquela responsável por Pedro Adão e Silva. Mas há quem aponte que as motivações políticas estiveram na origem da escolha de Francisca, não na sua saída.

O próprio afastamento de Elísio Summavielle do cargo, depois de empurrado pelos socialistas para um terceiro mandato à frente do CCB, terá sido precipitado por essas razões. Conforme o próprio assumiu, em entrevista à Sábado, a sua recusa em aceitar a "sugestão" de Pedro Adão e Silva, então ministro da Cultura, de criar um cargo à medida de Aida Tavares, amiga e apoiante de António Costa, levou a que tomasse a decisão de se demitir a meio do mandato. Dois meses depois de nomeada para o cargo, Francisca Carneiro Fernandes tomava a sua primeira decisão: contratar Aida Tavares para o novo lugar de diretora de Artes Performativas e do Pensamento do CCB.

Essa mesma história é relatada por Manuel Falcão, numa publicação feita no seu blog A Esquina do Rio. "Logo após a saída de Summavielle, que fez um exemplar trabalho de gestão e de abertura a novos públicos do CCB, a primeira medida de Francisca Carneiro Fernandes, foi admitir Aida Tavares, criando um novo cargo expressamente para ela, atendendo assim aos desejos do ministro e de António Costa, de que Tavares é uma convicta apoiante. O novo cargo tem um nome pomposo: diretora artística para as artes performativas e pensamento."

Bom conhecedor dos meandros culturais e dos media, Falcão, que foi fundador e Presidente da Associação de Produtores Independentes de Televisão e do Blitz, administrador da EGEAC e da RTP2, diretor do Centro de Espetáculos do CCB aquando da sua inauguração, entre muitos outros papéis de relevância assumidos ao longo de mais de 40 anos no meio, continua. "Na sequência da admissão de Aida Tavares foram afastadas a diretora de artes performativas, Paula Fonseca, e Margarida Serrão, coordenadora de produção e direção de cena. Ninguém pediu explicações sobre a substituição destas duas experientes profissionais, nomeadamente nenhum dos agora indignados pelo afastamento de Francisca Carneiro Fernandes, uma especialista na gestão de lobbies da área, e cuja orientação geral é um produto típico do pensamento Woke."

Lembrando que a nenhuma das vozes que agora se levantam se ouviu exigências de "transparência" sobre o que levara Summavielle a afastar-se em outubro do ano passado, ao fim de sete anos de expansão do CCB, Manuel Falcão contrapõe ainda argumentos aos que agora elogiam o "trabalho" feito por Francisca Carneiro Fernandes em 364 dias. "Aquando da inauguração, em março, da exposição de Patti Smith e Soundwalk Collective, um projeto que tinha sido acarinhado, viabilizado e concretizado por Elísio Sumavielle, a Sra. Francisca falou como se não tivesse existido no CCB ninguém antes dela, sem referir uma única vez que estava a inaugurar uma herança deixada pelo seu antecessor, no que foi aliás secundada pelo seu colega de administração, Delfim Sardo", vinca.

No requerimento apresentado para ouvir a ministra Dalila Rodrigues no Parlamento "com caráter de urgência", o grupo parlamentar do PS afirma que pretende saber "em que nova orientação e rumo irá assentar o CCB, uma vez que no último ano é reconhecido pelo setor, trabalhadores e agentes culturais o impulso que o CCB teve", relata a Lusa, acrescentando as motivações invocadas pelo BE em semelhante pedido, no qual acusa a atual titular da pasta da Cultura de protagonizar "exonerações abruptas e polémicas" em cargos diretivos e de pôr em causa "a continuidade de projetos e a ligação a redes internacionais e o desenvolvimento de importantes políticas culturais".