
Em janeiro, Guichard tinha sido condenado pelo Tribunal Central Criminal de Lisboa a uma pena única de 13 anos e 6 meses de cadeia, que substituiu as condenações (de 4 anos e 8 meses, 9 anos e 6 meses e 3 anos de cadeia) nos três processos em que foi julgado, ao lado do antigo presidente do BPP, João Rendeiro, e dos colegas de administração Salvador Fezas Vital e Fernando Lima.
O antigo administrador, que está a cumprir pena há mais de 3 anos na cadeia de Vale do Sousa, em Paços de Ferreira, recorreu do cúmulo jurídico, alegando que já assumiu os erros, demonstrou arrependimento e que chegou a pedir desculpa aos lesados, numa entrevista à SIC.
Guichard descreveu ainda, aos juízes do Supremo Tribunal de Justiça, de que forma a cadeia o mudou: “Mais humilde, menos materialista, com uma visão distinta da vida e da sua própria razão de ser”.
“O arguido vem pautando a sua vida em reclusão pela adesão a atividades ocupacionais, demonstrou ter grande sentido pelas causas sociais e dispõe atualmente de um posto de responsabilidade na biblioteca central do EP. Tem ainda feito desenhos, subordinados ao tema ‘Entre Grades Muros e Sonhos’, que está a tentar expor em galerias, com o intuito de canalizar o produto das vendas para o pagamento das indemnizações em que foi condenado”, lê-se no recurso da defesa de Paulo Guichard.
Agora com 64 anos, Guichard contou no recurso que casou novamente, já no decorrer da reclusão. Fora da cadeia, tem ainda a mãe, com idade avançada, dois filhos e um neto de 1 ano: “Um neto que não conhece e com quem dificilmente estabelecerá laços afetivos e de convivência se sujeito a uma excessivamente longa pena de prisão.”
"O resultado da pena aplicada, a manter-se, equivaleria a uma pena por quase o tempo da vida útil que resta ao arguido, pois, com 78 anos já pouco restará da vida para viver – o que evidencia a desproporcionalidade da pena", refere o recurso de Guichard.
Os quatro juízes conselheiros, que assinam o acórdão, com data de 16 de julho, terão sido sensíveis aos argumentos da defesa. Ainda assim, não aceitaram a justificação de Guichard de que parte do seu comportamento delituoso se deveu ao poder exercido por João Rendeiro "que tinha uma personalidade dominante e alheia às regras e ao direito" e a fatores conjunturais que levaram a um cenário de insolvência, descrito como uma "verdadeira surpresa".
"(…) A única surpresa foi para os clientes depauperados que se viram sem as suas poupanças enquanto o arguido e demais comparsas embolsavam os milhões de que se locupletavam à revelia das autoridades supervisoras ocultando destas a verdade contabilística ao mesmo tempo que os iam desviando conscientemente e sem controlo possível daquelas autoridades", lê-se no acórdão do Supremo.
Além disso, acrescenta o acórdão: "Toda a sociedade sabe e sente a par da fraude fiscal, que uns quantos vivem "à tripa forra" fugindo de qualquer modo ao pagamento dos impostos, sentimento que não é de agora. Este é aliás um flagelo social de muito difícil controlo que só uma educação para a cidadania pode ajudar a debelar."
Depois do desabafo, o Supremo acaba a corrigir a pena única para os 11 anos de cadeia: “(…) em face do efeito previsível da pena no comportamento futuro do arguido, e da sua capacidade de prosseguir um modo de vida compatível com as regras em sociedade”.
Para além de Paulo Guichard, também Salvador Fezas Vital e Fernando Lima estão já a cumprir penas de cadeia.
João Rendeiro, o homem que liderou o banco, nunca chegou a cumprir as punições em Portugal. Fugiu para a África do Sul em setembro de 2021, onde seria capturado três meses depois. Em maio do ano seguinte foi encontrado morto na cadeia de Westville.