“Estou em choque… faço isto há muito tempo, há mais de 45 anos, e esta é a primeira vez que ganho algo como atriz”. Foram estas as primeiras palavras de Demi Moore após receber o Globo de Ouro pela participação em“A Substância”.

Como a própria referiu, foi preciso esperar muito tempo, algo que chega a ser estranho se pensarmos que se trata de uma das atrizes mais populares de Hollywood. Mas a verdade é que para Demi Moore com a fama não veio o reconhecimento, pelo menos o reconhecimento do trabalho enquanto atriz.

Mario Anzuoni

Durante o discurso, a atriz falou sobre ter sido rotulada por um produtor como “atriz pipoca” - ou seja, alguém que é comercialmente bem sucedida, mas não digna de aclamação - e isso acabou por marcar a forma como se via dentro da indústria.

“Naquela época eu interpretei isso como se isto [o prémio] não fosse algo que eu pudesse ter. Eu podia fazer filmes que fossem bem-sucedidos, que fizessem muito dinheiro, mas não ia ser reconhecida. Eu acreditei nisso e isso corroeu-me ao longo do tempo, ao ponto de, há alguns anos, pensar que era verdade. Talvez eu estivesse completa, talvez eu tivesse feito o que deveria fazer”, disse.

“E enquanto eu estava num momento mau, recebi um roteiro mágico, ousado, corajoso, fora da caixa, absolutamente insano, chamado “A Substância”, e o universo disse-me que eu ainda não tinha terminado”, acrescentou.

No filme, Demi Moore interpreta Elizabeth Sparkle, uma apresentadora de televisão que é despedida no dia em que celebra 50 anos. Desolada, volta a casa e depara-se com uma inesperada proposta: um misterioso laboratório oferece-lhe uma milagrosa “substância” que, se ela injetar, vai conseguir tornar-se numa melhor versão de si mesma.

Uma carreira marcada pela polémica

A entrada de Demi Moore no mundo artístico foi classificada por alguns como vulgar - um fotógrafo convenceu-a a posar nua quando tinha 17 anos e vendeu as fotografias a uma revista. Seguiu-se uma participação no filme “Blame It on Rio” (1984), que também não conquistou muitos elogios.

O primeiro grande êxito, e um dos pontos de viragem na carreira da atriz, aconteceu em 1990 com “Ghost”. O filme foi um sucesso de bilheteira nos Estados Unidos e lançou Demi como um ícone da moda. É aí que o seu ‘famoso’ corte de cabelo virou referência na moda.

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Aliado a isso, nessa altura era casada com o ator Bruce Willis, o que fazia dela uma das mais famosas do mundo. Era perseguida por ‘paparazzi’ e frequentemente capa de revistas.

Nos dois anos seguintes, posou para a capa da Vanity Fair, - a primeira exibindo a barriga de grávida e a segunda apenas com um fato pintado no corpo - o que leva a crítica a focar-se na sua aparência e não no trabalho como atriz. Entre 1996 e 1997 chega uma nova viragem.

"Striptease" e "G.I. Jane"

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A atriz participou em “Striptease” e "G.I. Jane" e a sua carreira ficou marcada para sempre. Numa entrevista, chegou a dizer que “com Striptease, foi como se eu tivesse traído as mulheres, e com G.I. Jane, foi como se eu tivesse traído os homens”.

No primeiro, interpretou uma mãe divorciada que é bailarina de striptease para conseguir juntar dinheiro e ganhar a custódia do filho. No segundo, é a primeira mulher recruta num grupo de elite de forças especiais da Marinha americana.

Ambos acabaram por ser um fracasso, o que prejudicou não só a sua carreira, mas também a saúde. A atriz explicou que para alcançar o físico desejável, passou fome ao ponto do leite materno ficar sem gordura para nutrir a filha.

Na altura foi, também, tema de conversa na comunicação social devido ao polémico ordenado. Por “Striptease”, recebeu 12,5 milhões de dólares, tornando-se a atriz mais bem paga do mundo à época.

Chris Pizzello

A infância conturbada e os problemas de álcool

Em 2019, Demi Moore lançou a biografia “Inside Out”, onde revelou algumas experiências traumáticas que teve de enfrentar ainda muito nova. Os pais eram alcoólicos e a mãe tentou suicidar-se várias vezes. Com apenas 15 anos foi violada por um homem que lhe terá dito: “Qual é a sensação de ser prostituída pela tua mãe por 500 dólares?”.

Aos 16 anos saiu de casa e rapidamente começou a trabalhar como atriz e modelo. Um ano depois casou com o primeiro marido, Freddy Moore, e aos 21 entrou para a reabilitação, - com a ajuda de Joel Schumacher, realizador de "St Elmo's Fire” - devido a problemas com o álcool. Conseguiu recuperar, mas voltou a ter uma recaída durante o tempo em que esteve casada com Ashton Kutcher (de 2005 a 2013).

Amanda Edwards

Além dos problemas ligados às dependências, teve de enfrentar, também, as opiniões constantes à sua imagem. Depois das polémicas nos anos 90, a década seguinte chegou com crises de identidade. Aos 40 anos, participou em “Charlie's Angels” e, quando a imprensa divulgou que iria fazer cenas em biquíni, chegaram as críticas de que estaria muito velha para isso.

A situação não melhorou nos anos seguintes, com Demi Moore a aceitar fazer papéis mais pequenos e sem grande aclamação do público. Naquele momento ela era uma atriz que a indústria dizia já estar acabada.

O renascimento pessoal e profissional acontece em 2024 ao protagonizar “A Substância”. O filme foi premiado em Cannes e alcançou a melhor bilheteira de sempre da Mubi. Com isso, também Demi Moore começa a ser, como a própria diz, reconhecida finalmente pelo seu trabalho. Alcançou prémios em várias premiações como os Globos de Ouro, o Critics Choice Awards, os Satellite awards e os Screen Actors Guilds Awards.

SIC Notícias