É em plataformas como o TikTok, X ou Instagram que os jovens passam muito do seu tempo livre e, de acordo com especialistas, a informação que aí consomem é aquela que mais influencia as atitudes populistas.

Nos últimos anos, a publicação de conteúdos extremistas tem crescido nas redes sociais, com vídeos em que são partilhadas opiniões contra o feminismo, a comunidade LGBTQIA+ ou imigrantes a atingir milhões de visualizações e 'likes'.

Alguns dos influenciadores digitais que mais publicam esse tipo de conteúdo reúnem o apoio de milhares de jovens, sobretudo rapazes, e a popularidade das publicações ajuda a legitimar aquelas mensagens, mas aquilo que para alguns parecia ser uma "moda" do digital começa a observar-se também nas escolas.

"Isto já não está circunscrito às redes sociais e começa a tomar proporções outrora inimagináveis", alerta o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP).

Recordando o resultado das eleições legislativas de 18 de maio, Filinto Lima não tem dúvidas de que o crescimento do Chega é, em parte, explicado pelo voto dos jovens, porque o alinhamento com as posições daquele partido de extrema-direita é algo que vê cada vez mais entre os seus alunos.

A tendência é confirmada por Manuel Pereira, que começa por considerar que o espírito rebelde é normal da adolescência. A diferença, acrescenta o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), é que algumas das ideias mais extremistas são agora partilhadas por líderes políticos e criadores de conteúdo vistos como referência.  

"Muitos destes jovens acham 'cool' estar ao lado das ideias daqueles que querem mudar tudo", refere, relatando que muitos dos alunos da escola que dirige, em Cinfães, "já expressam ativamente essas posições".

De acordo com Ricardo Soares, investigador do Centro de Investigação e Intervenção Educativas da Universidade do Porto, as atitudes populistas dos jovens "estão relacionadas com o consumo de informação nas redes sociais", por onde navegam sem filtros ou orientação.

"Estas ideias de extrema-direita estão a ser construídas sem balizas, porque no essencial os jovens estão a formar opiniões e a tomar decisões sem rede e sem acompanhamento", sublinha o presidente da ANDE, acrescentando que a maioria dos docentes não utiliza aquelas plataformas.

Para Manuel Pereira, existe uma "competição desleal", em que os professores estão em clara desvantagem e, por isso, defende a necessidade urgente de formar docentes e não docentes nessas áreas.

Co-fundador do projeto "Agarrados à Net", Tito de Morais concorda que a resposta deve passar pela formação, de professores e encarregados de educação, mas também por reforçar determinados conteúdos nos currículos.

Recordando sessões que realiza em escolas, relata que quando estão em discussão questões como o 'cyberbullying' ou relacionadas com a sexualidade, é frequente ouvir comentários de rapazes que defendem, por exemplo, que imagens íntimas de raparigas podem ser partilhadas.

"Precisamos de bons cidadãos, 'offline' ou 'online'. Se eu tiver a sorte de os meus filhos terem um professor para quem este é um tema sensível, o tema é trabalhado. Se não tiver essa sorte, o tema não é trabalhado", lamenta.

Além destas, Manuel Pereira considera que disciplinas como História ou Filosofia têm sido descuradas e entende que, atualmente, os alunos "estão relativamente mal informados em relação aos processos históricos".

"O que é que a escola não tem feito para dar aos alunos a capacidade de organizar as ideias? O pensamento tem que ser organizado tendo em atenção o passado, é preciso que percebam onde estão e como se chegou aqui. Provavelmente, isso não está a acontecer", alertou.

A isso, o investigador Ricardo Soares acrescenta a importância da participação democrática dos alunos nas decisões da escola e explica que, de acordo com um estudo realizado em 2023, os jovens de extrema-direita "reportam ter vivido um clima menos democrático nas universidades e nas escolas".

Segundo o presidente da ANDE, esse esforço já é feito, mas o desafio é "encontrar os limites da participação", porque, frequentemente, é sobre temas "em que não se pode mexer", como os currículos, que os alunos querem ter uma palavra a dizer.

 

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