A diretora da Obra Católica Portuguesa de Migrações (OCPM) considera que os imigrantes não católicos ajudam a construir em diálogo a identidade cristã da própria Europa, lamentando as críticas de setores conservadores a quem é de outra cultura.

"A nossa orientação pastoral é que temos que entrar em diálogo", porque "a nossa identidade cristã constrói-se em diálogo" com quem é diferente, afirmou à Lusa Eugénia Quaresma, quando passa um ano desde a aprovação do Plano de Ação para as Migrações.

Nos últimos anos tem-se acentuado o discurso anti-imigrante na Europa em nome dos valores judaico-cristãs, mas Eugénia Quaresma considera que a presença de pessoas de outras culturas exige um cristianismo mais comprometido.

"Parte do discurso [negativo] até vem de dentro da própria Igreja", onde existe quem se sente "ameaçado com a presença de migrantes que não são católicos", mas "aqueles que vêm, são irmãos e irmãs que nos podem ajudar a arrumar a casa e a construir a nossa sociedade de acordo com os nossos princípios e valores humanos judaico-cristãos", explicou.

Eugénia Quaresma recordou que os britânicos e franceses estão entre as nacionalidades mais presentes entre os estrangeiros mas essa questão não se coloca para o discurso populista, que prefere focar-se em quem chega da Índia ou Bangladesh.

"Quanto mais eu me relaciono, mais eu vou aprofundando as raízes do que é ser cristão e da importância que estes valores têm para que a humanidade seja mais humana", disse, salientando que os "valores cristãos ajudam, têm ajudado, ajudaram a construir a Europa e ajudam a transformar o mundo para melhor".

A OCPM gere uma rede de estruturas de apoio a imigrantes e refugiados, muitos deles em situações frágeis, e Eugénia critica a falta de diálogo e de políticas públicas que apoiem estas populações carenciadas.

Anunciado a 03 de junho do ano passado, o Plano de Ação para as Migrações contemplava um leque de 41 medidas que visavam condicionar a chegada de novos estrangeiros.

A principal medida foi o fim das manifestações de interesse, um mecanismo que permitia a regularização de estrangeiros mesmo com visto de turismo, desde que tivesse 12 meses de descontos.

Este recurso, o principal motivo para as pendências existentes, teve um efeito de chamada e trouxe milhares de imigrantes para o país.

"Acho que este Governo começou por querer dialogar com todos aqueles que estavam no terreno e por querer implementar as medidas de uma forma concertada" e o "encerramento das manifestações de interesse tiveram a ver com o uso indevido deste mecanismo de regulação excecional", reconheceu Eugénia Quaresma.

Contudo, permanece a falta de diálogo com a sociedade civil e "continuam a haver muitas queixas relativamente à comunicação com a AIMA [Agência para a Integração, Migrações e Asilo], com parte dos migrantes a não conseguirem uma resposta imediata".

Para Eugénia Quaresma, o problema é global de políticas públicas, que retirem a exposição negativa sobre os imigrantes.

"Só melhorando os nossos serviços, a nossa maneira de atender deixaremos de ter imagens que continuam a ser instrumentalizadas politicamente contra os próprios migrantes", defendeu.

À OCPM, além do apoio direto, cabe "ajudar as comunidades cristãs a entender o fenómeno migratório como algo natural e de que precisamos", acrescentou a dirigente.