Milhares de indígenas acampam desde segunda-feira em Brasília, capital brasileira, numa semana de luta pelos seus direitos, para serem ouvidos nas decisões da Conferência da ONU do Clima e por um futuro "que não está à venda".

Na terça-feira, mais de seis mil indígenas marcharam do Acampamento Terra Livre (ATL) até ao Congresso brasileiro onde mais de 500 lideranças indígenas foram recebidas numa sessão solene em homenagem à 21.ª edição deste evento, de acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que organiza este que é considerado o maior ajuntamento de povos indígenas da América Latina.

"Se precisar subir o tom nós vamos subir. Se precisar conversar nós vamos conversar. Mas em nenhum momento vamos negociar os direitos indígenas, vamos usar o tom necessário para garantir os nossos direitos que estão sendo ameaçados neste momento", destacou Dinamam Tuxá, da coordenação executiva da Apib, de acordo com a organização.

Na Câmara dos Deputados, umas das reivindicações que mais se fez ouvir foi contra o chamado "marco temporal".

Eraldo Peres

O que é o "marco temporal"?

O Congresso, dominado por partidos de centro-direita e extrema-direita com fortes vínculos com o setor agrícola, aprovou no ano passado uma lei que legaliza o "marco temporal", tese jurídica que limita os direitos indígenas às áreas que ocupavam na época da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.

De acordo com os indígenas e organizações da sociedade civil, esta lei fragiliza os direitos territoriais dos povos originários do Brasil, já que muitos indígenas foram deslocados à força e expulsos de territórios pelos militares que governavam o país antes da redemocratização consolidada com a promulgação da Constituição de 1988.

Essa legislação foi aprovada no parlamento brasileiro numa resposta da bancada ruralista e da oposição a um julgamento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou, analisando um caso específico com repercussão geral, que a tese que sustenta o Marco Temporal era inconstitucional.

Eraldo Peres

A lei do Marco Temporal chegou a ser vetada pelo atual Presidente brasileiro, Luís Inácio Lula da Silva, mas o Congresso derrubou o veto e está em vigor.

"A luta dos povos indígenas é a mãe de todas as lutas, e por isso nós seguimos falando não à mineração nos territórios indígenas, não ao marco temporal, nunca mais o Brasil sem nós", frisou a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, no discurso na Câmara dos deputados.

Outra das lutas mais intensas é a demarcação das suas terras

Embora o Governo de Lula da Silva tenha retomado as demarcações, os povos indígenas exigem mais agilidade na análise de uma centena de processos, que se somariam às cerca de 600 já reconhecidas e que ocupam cerca de 14% do território nacional.

Até sexta-feira, calcula-se que 8.000 indígenas, de mais de 200 povos, estejam presentes no acampamento em Brasília.

Eraldo Peres

Entre os temas debatidos na plenária principal do acampamento estão ainda os conflitos em territórios indígenas, a criação da Comissão Nacional da Verdade Indígena, a Câmara de Conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF), a transição energética justa e a resistência LGBTQIA+.

De acordo com os últimos censos brasileiros vivem no país quase 1,7 milhão de indígenas, que ocupam cerca de 14% do território nacional.