O procurador-geral da República (PGR) admitiu hoje preocupação com o aumento da criminalidade relacionada com crimes de ódio e extremismos, sublinhando a dificuldade de investigar e documentar este tipo de casos para sustentar uma acusação.

Em declarações aos jornalistas, à saída da cerimónia de lançamento do Centro de Conhecimento dedicado à investigação e promoção do Direito e dos Direitos da Criança da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, o PGR, Amadeu Guerra, questionado sobre o relatório do Conselho da Europa que aponta falhas a Portugal em termos policiais e judiciais em casos de crimes de ódio, admitiu preocupação, mas não exclusivamente sobre os crimes de ódio.

"Qualquer aumento de criminalidade me preocupa, nomeadamente na área do ódio, da violência doméstica, dos homicídios em contexto de violência doméstica. Também o extremismo, tudo aquilo que seja atentar contra a liberdade dos cidadãos me preocupa", disse o PGR, que reconheceu dificuldades específicas nos crimes de ódio que dificultam a ida a julgamento.

Referiu que a dificuldade em documentar os processos com provas da prática do crime, que muitas vezes acontece entre duas pessoas, sem testemunhas ou registo, leva a que a opção do Ministério Público (MP) seja a de não levar a julgamento, por não ter como sustentar a acusação.

Questionado sobre exemplos de outros países do norte da Europa onde existem 'task forces' dedicadas exclusivamente a este tipo de crimes, Amadeu Guerra disse que "gostava de ter uma 'task force' para tudo", mas insistiu na falta de meios do MP.

A Comissão Europeia contra o Racismo e Intolerância (ECRI), órgão do Conselho da Europa, divulgou hoje os resultados do trabalho de um grupo de peritos independentes que analisou o racismo, a discriminação, a xenofobia, o antissemitismo e a intolerância em Portugal.

O relatório lembra que em Portugal existem casos de violência motivada pelo ódio, que por vezes envolvem grupos neonazis. No entanto, os peritos acusam as polícias de, muitas vezes, não registarem as queixas e de serem poucos os casos que avançam para julgamento.

Dos poucos processos que chegam à justiça, são ainda menos os que resultam em decisões judiciais, concluem os peritos, que recomendam a aplicação de medidas que melhorem as relações e a confiança entre a polícia e alguns grupos como é o caso dos migrantes, negros, LGBTI ou os ciganos.

Os crimes de discriminação e incitamento ao ódio e à violência aumentaram mais de 200% nos últimos cinco anos, segundo as Estatísticas da Justiça, havendo registo de 421 casos em 2024, o ano com mais ocorrências.