Portugal é um dos 15 países da União Europeia (UE) que não reconhecem o Estado da Palestina, um tema que divide os Estados-membros, que apoiam no entanto a solução dos dois Estados para o conflito israelo-palestiniano.

O Estado da Palestina é reconhecido oficialmente por 12 Estados-membros da UE, incluindo Espanha, Irlanda e Eslovénia, que deram esse passo no ano passado, em plena ofensiva israelita na Faixa de Gaza.

Desde o início deste conflito, em outubro de 2023, primeiro o Governo socialista de António Costa e, depois, o executivo de Luís Montenegro (PSD/CDS-PP) mantiveram reserva nesta matéria.

O PS preferia avançar em conjunto com outros países europeus, enquanto a atual coligação governamental considera que, a acontecer agora, não passaria de um "passo simbólico", mas ressalvando que é um assunto "sempre em avaliação".

Agora na oposição, o PS leva ao parlamento na quinta-feira um projeto de resolução a pedir que o Governo faça este reconhecimento "de forma imediata".

Pelas vozes do primeiro-ministro, Luís Montenegro, e do ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, o Governo tem defendido a solução dos dois Estados - Israel e Palestina - e insiste numa posição de mediador, apontando por isso a necessidade de manter o diálogo com todas as partes envolvidas no conflito.

Na semana passada, o ministro dos Negócios Estrangeiros anunciou que o Governo português mantém a posição de não reconhecer o Estado da Palestina.

"Um gesto inédito da diplomacia portuguesa"

Em maio passado, Portugal votou favoravelmente ao alargamento dos direitos da Palestina nas Nações Unidas, que Rangel destacou como "um gesto inédito da diplomacia portuguesa".

O ministro também já tinha revelado que conseguiu levar "pelo menos dois países" da União Europeia a votar favoravelmente este projeto de resolução na ONU, apresentado pelos Emirados Árabes Unidos em representação do Grupo de Países Árabes.

Dentro da UE, 12 Estados-membros reconhecem já a Palestina: Bulgária, Chipre, República Checa, Hungria, Malta, Polónia, Roménia e Eslováquia desde 1988, antes de aderirem ao bloco europeu, enquanto a Suécia o fez sozinha em 2014, cumprindo uma promessa eleitoral dos sociais-democratas então no poder.

Já em maio do ano passado, Espanha, Irlanda e Noruega (não pertence à UE) deram o mesmo passo, em conjunto, e a Eslovénia fez o mesmo no mês seguinte.

Esta semana, a chefe da diplomacia da União Europeia insistiu no apoio à Autoridade Palestiniana e à solução dos dois Estados (Israel e Palestina).

No contexto da Organização das Nações Unidas, 146 dos 193 membros reconhecem a Palestina.

Parlamento debate na quinta-feira recomendações sobre reconhecimento da Palestina

Os partidos da esquerda levam na quinta-feira ao parlamento recomendações para que o Governo português reconheça o Estado da Palestina, enquanto a Iniciativa Liberal pede que não o faça até que haja "negociações diretas" entre israelitas e palestinianos.

Os deputados debatem em plenário na quinta-feira um total de nove projetos de resolução, entre os quais do PS, PCP, Bloco de Esquerda, Livre e PAN a pedir o reconhecimento do Estado da Palestina, com as fronteiras definidas antes da Guerra dos Seis Dias de 1967, quando Israel anexou Jerusalém Oriental.

O que defende a esquerda?

Os socialistas pedem que esse reconhecimento seja feito "de forma imediata" e propõem que o Governo aprofunde as relações diplomáticas com o Estado da Palestina, "mantendo como legítimo interlocutor a Autoridade Palestiniana, e conferindo à missão diplomática da Palestina em Lisboa o estatuto de embaixada".

O Bloco recomenda igualmente o reconhecimento "imediato" do Estado da Palestina.

Também o Livre quer o "reconhecimento urgente da independência da Palestina", através de um "ato diplomático e público", e "garantindo a exclusão de qualquer grupo terrorista como representante do povo palestiniano e mantendo como interlocutora a Autoridade Palestiniana, internacionalmente reconhecida".

O Livre apresenta duas outras iniciativas, recomendando ao Governo que participe nas operações de evacuação médica na Faixa de Gaza, além de propor a criação de um Fundo Internacional para a Reconstrução do enclave palestiniano, que esteve durante 15 meses sujeito a uma ofensiva israelita, que fez mais de 47 mil mortos, após o ataque do movimento islamita Hamas a Israel em outubro de 2023.

O PCP pede que, além de reconhecer o Estado da Palestina, o Governo "assuma essa posição no âmbito da Organização das Nações Unidas e noutras instâncias internacionais" e defenda "o cumprimento do direito de retorno dos refugiados palestinianos, conforme determinado pelas resoluções da ONU".

O PAN quer ainda que o Estado português apoie as resoluções adotadas pelas Nações Unidas com vista à concretização de um cessar-fogo, à manutenção da paz na região e que empregue esforços na ajuda ao povo palestiniano e em respeito pelos direitos humanos.

A deputada única do PAN, Inês de Sousa Real, apresenta uma outra proposta pedindo que o executivo "proceda ao levantamento dos portugueses e familiares de portugueses ainda retidos na Faixa de Gaza", indicando "cerca de 140 pessoas com ligação" a Portugal, e tome as diligências necessárias junto de Israel e do Egito para extraditar estas pessoas.

O que defende a Iniciativa Liberal?

Da direita, apenas a Iniciativa Liberal (IL) leva a este debate um projeto de resolução, pedindo o contrário: que o Governo "se abstenha de proceder ao reconhecimento imediato do Estado da Palestina, condicionando tal decisão à existência de negociações diretas entre Israel e a Palestina, que garantam a coexistência pacífica e a segurança mútua".

Segundo a IL, o executivo deve "continuar a defender, em todas as instâncias internacionais relevantes, a necessidade de uma solução justa e duradoura para o conflito, baseada nos princípios da solução de dois Estados e no respeito mútuo entre todas as partes envolvidas, de forma a que haja um amplo consenso entre todos os países das Nações Unidas, para um reconhecimento mútuo e total de Israel e da Palestina".

A bancada liberal defende ainda que Lisboa promova "no âmbito da União Europeia, uma abordagem coordenada e consistente sobre o conflito israelo-palestiniano, que valorize o papel da mediação internacional e o respeito pelos princípios do direito internacional", além de condenar "todas as formas de terrorismo, independentemente da sua origem, reafirmando o compromisso de Portugal com a paz, os direitos humanos e a segurança internacional".

Debate não é inédito no Parlamento

Este não é um debate novo na Assembleia da República: em dezembro de 2014, o parlamento aprovou por maioria uma recomendação para que o Governo - então do PSD/CDS-PP, chefiado por Pedro Passos Coelho - reconhecesse o Estado da Palestina, uma proposta conjunta do PSD, CDS-PP e PS que teve nove votos contra de deputados dos grupos proponentes.

"O Governo é sensível ao apelo da Assembleia da República e procurará escolher o momento mais adequado para proceder ao reconhecimento do Estado da Palestina de modo a que esse ato possa facilitar a solução que se considera necessária para que israelitas e palestinianos convivam duradouramente de forma pacífica", reagiu o então ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, no parlamento.