
O ex-candidato presidencial moçambicano Venâncio Mondlane lamentou esta segunda-feira não ter sido recebido, na sua visita a Portugal, pelo chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa, que considerou ser "da família", admitindo querer dizer-lhe que "meteu água".
"Vocês sabem que o Marcelo [Rebelo de Sousa] tem ligações telúricas muito fortes com Moçambique. Então, ele, em certa parte, é da nossa família. É daquelas coisas que, quando a gente depois se encontrar em família, vamos falar e dizer que, mano, aqui, você meteu água", afirmou Venâncio Mondlane, em declarações aos jornalistas após sair do aeroporto de Maputo, esta tarde.
O político, que não reconhece os resultados das eleições gerais de 09 de outubro, chegou a encontrar-se com Marcelo Rebelo de Sousa, em Lisboa, no período que antecedeu a companha eleitoral, em 2024, encontro que não se repetiu desta vez. "Eu só posso dizer que foi realmente uma grande pena o Marcelo [não o ter recebido], que eu considero ele, digamos, um pai, um irmão", afirmou.
Durante as últimas semanas, na Europa, Venâncio Mondlane manteve encontros no parlamento português com vários partidos, mas o político sublinhou a receção que teve no parlamento alemão.
"Não acho que tenha sido alguma coisa que desprestigiasse ou que diminuísse a minha missão na Europa [não ter sido recebido por Marcelo Rebelo de Sousa]. Eu peço muita desculpa, não é um desprimor a Portugal, mas eu tive encontros muito mais altos, tive privilégios incríveis de ser recebido, por exemplo, na Bundestag, o parlamento alemão, quando estava-se a discutir o orçamento da Alemanha", apontou.
"O vice-presidente do parlamento alemão interrompeu a discussão do Orçamento para receber o Venâncio. Nunca vi nada que pudesse superar isso em toda a minha carreira política e cívica", acrescentou.
Venâncio Mondlane sublinhou que durante a visita à Europa se reuniu com partidos "desde a extrema-esquerda até à extrema-direita", com o objetivo de fazer "um novo debate de conceitos de política". "Infelizmente dizem que em África nós só consumimos, nunca produzimos nada, nem de ciência. Então eu fui provocar na Europa o debate sobre as novas ideologias, as ideologias do futuro. Porque essas ideologias do centro, da esquerda e da direita são ideologias do século passado", disse ainda, afirmando que defende uma "ideologia do futuro".
"A ideologia do futuro é a ideologia da humanidade. É essa que eu defendo e eu penso que provocamos um bom debate como africanos", concluiu.
O ex-candidato presidencial esteve algumas semanas na Europa, em contactos em Portugal e na Alemanha, e anunciou que chegaria ao aeroporto internacional de Maputo esta segunda-feira à tarde, tendo sido recebido por várias dezenas de apoiantes, cerca das 15h30 locais (menos uma hora em Lisboa), com cânticos de "salve Moçambique, este país é nosso", tal como na campanha eleitoral e nas manifestações pós-eleitorais.
Pelas 16h00 locais, o político, envolvido por uma moldura humana e com vários meios da polícia posicionados no interior e nas avenidas adjacentes ao aeroporto, deixou o local, em direção a casa, no centro de Maputo, percurso em que foi escoltado por várias viaturas da Unidade de Intervenção Rápida (UIR), que realizaram mais de uma dezena de disparos de gás lacrimogéneo ao longo dos 10 minutos de viagem, enquanto apoiantes se concentravam nas ruas ao ver Venâncio Mondlane no tejadilho da viatura, perante um trânsito quase bloqueado.
Moçambique viveu desde as eleições de outubro um clima de forte agitação social, com manifestações e paralisações convocadas por Mondlane, que rejeita os resultados eleitorais que deram vitória a Daniel Chapo, apoiado pela Frelimo, partido no poder, eleito Presidente da República.
Segundo organizações não-governamentais que acompanham o processo eleitoral, cerca de 400 pessoas perderam a vida em resultado de confrontos com a polícia, conflitos que cessaram após encontros entre Mondlane e Chapo, em 23 de março e 20 de maio, com vista à pacificação do país.