
O caso da violação de uma adolescente em Loures está longe de estar fechado. A investigação prossegue mas as medidas de coação aplicadas às três suspeitos estão a gerar contestação. Um manifesto, já assinado por quatro dezenas de organizações e mais de 1.400 pessoas, reclama que a saída em liberdade dos suspeitos transmite uma“perigosa mensagem de impunidade” e “perpetua a cultura de violência contra mulheres”.
Em reação não só a este manifesto mas também às "notícias e comentários publicados na comunicação social", o Conselho Superior da Magistratura (CSM) veio a público prestar alguns esclarecimentos sobre o caso, assegurando, desde logo, que "os/as juízes/juízas decidem de forma independente e imparcial, com base nos elementos constantes dos autos e no cumprimento rigoroso da lei".
Neste sentido, e reportando ao caso em concreto, o CSM explica que a constituição de "arguido detido não corresponde a um julgamento dos factos, nem tem em vista a antecipação da aplicação de penas, tendo por fim, tão somente, a aplicação de medidas de coação destinadas a acautelar perigos".
E que "perigos" são esses? Desde logo "fuga ou perigo de fuga, perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova ou, ainda, perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a atividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas".
Voltando ao caso concreto da violação de uma jovem de 16 anos, o CSM refere que "após interrogatório e de acordo com os elementos de prova disponíveis", os três arguidos foram submetidos, "por decisão do tribunal de instrução criminal, às medidas de coação não privativas da liberdade que foram promovidas pelo Ministério Público".
"Estas medidas foram consideradas, face aos elementos disponíveis nos autos, proporcionais e adequadas às finalidades de natureza cautelar que visam assegurar".
As três arguidos foram, recorda o Conselho Superior da Magistratura, aplicadas quatro medidas de coação, designadamente:
- obrigação de apresentação semanal em posto policial da área da respetiva residência;
- obrigação de não contactar a ofendida por qualquer meio, incluindo redes sociais e através de interposta pessoa;
- obrigação de não se aproximarem a menos de 50 metros da ofendida; e,
- obrigação de não se aproximarem a menos de 500 metros da casa onde reside ou noutra em que venha a residir, bem como do estabelecimento escolar que frequente.
Tendo em conta que o caso está em segredo de justiça, esta é para já "a única informação pública possível", mas a investigação prossegue e, lembra o CSM, "a decisão do tribunal é passível de recurso, nos termos da lei".
"Libertação dos três arguidos suscita indignação e alarme"
No manifesto, divulgado pela Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, é exigido o reforço das medidas de coação dos três suspeitos que ficaram em liberdade, apenas proibidos de contactar a jovem de 16 anos.
“A libertação dos três arguidos suscita indignação e alarme. Este caso evidencia um problema sistémico na aplicação de medidas de coação inadequadas para a prevenção de crimes contra mulheres e raparigas, revelando falhas estruturais na proteção das vítimas e uma menorização dos crimes praticados”, é defendido no manifesto.
“A resposta judicial até ao momento transmite uma perigosa mensagem de impunidade, minando a confiança no sistema de Justiça e perpetuando a cultura de violência contra as mulheres e raparigas”, é acrescentado.
No manifesto, é igualmente pedida a "suspensão imediata" do acesso dos jovens a redes sociais. O objetivo, alega-se, é impedir que os suspeitos continuem a instrumentalizar o crime e a expor a vítima.
“Os três jovens arguidos continuam com acesso aos seus perfis digitais, o que possibilita, perversamente, a capitalização do tema-notícia pelos próprios e a culpabilização da vítima”, sustenta o manifesto.
Há uma semana, a Polícia Judiciária deteve, em Loures, três jovens, entre os 17 e os 19 anos, suspeitos de violarem uma rapariga e de partilharem o vídeo do crime nas redes sociais. Já em liberdade, um dos jovens voltou às redes sociais.