
O ex-futebolista Louis Saha considera que Cristiano Ronaldo, antigo colega de equipa no Manchester United, "revolucionou a forma como os extremos jogam", por assumir o papel de goleador numa carreira que perdura, aos 40 anos.
Jogador dos red devils entre as temporadas 2003/04 e 2007/08, o antigo internacional francês testemunhou a evolução do astro português, que se mudou do Sporting para Inglaterra aos 18 anos, com um futebol assente no drible e na velocidade, antes de se distinguir cada vez mais pelos golos e de contrariar uma tradição em que a principal função do ala é criar desequilíbrios e assistir.
"Eu conheci-o como extremo. Supostamente, o papel dele era cruzar a bola para o Van Nistelrooy, para mim ou, mais tarde, para o Tévez. Na última época em que estou no United, ele marca mais de 30 golos [42]. Cristiano Ronaldo revolucionou a forma como os extremos jogam. Nos últimos anos, vimos Salah e Sadio Mané a marcar muitos golos, mas o Ronaldo fez isso antes", realça, em entrevista à Lusa.
A orientar um campo de treinos para crianças e jovens entre os cinco e os 16 anos no Pine Cliffs Resort, no concelho algarvio de Albufeira, a par de John O'Shea e Dimitar Berbatov, outros dois antigos jogadores do United, Saha transferiu-se do Fulham para o clube de Old Trafford em janeiro de 2004, a meio da primeira época de Ronaldo na Premier League, e cedo se apercebeu que o madeirense "era especial".
"Reconheci, de imediato, que o Cristiano Ronaldo era especial, não só porque era o jogador mais talentoso, mas também porque era o que trabalhava mais arduamente fora do centro de treinos. Ele trabalhava em casa. Chegava cedo ao treino", recorda.
O antigo ponta de lança, hoje com 46 anos, recorda-se que o português que agora soma 221 internacionalizações conseguia estar "recuperado 70 a 80%" dois dias após um jogo, mesmo sofrendo alguma mazela, talvez porque "desde cedo investiu no seu corpo e nos melhores processos de recuperação", hoje mais padronizados.
O gaulês também se lembra de tentar adotar a rotina seguida pelo internacional luso após a conclusão dos treinos, com vários exercícios de "intensidade muito alta", e de ficar extremamente cansado.
"Ao fim de uma ou duas horas, eu estava 'morto'. Ele fazia aquilo no fim de todos os treinos. Era uma 'máquina'. Ninguém se aguentava com aquela rotina. Tem uma dedicação extraordinária", descreve o ex-jogador que alinhou também ao lado dos portugueses Luís Boa Morte, no Fulham, Nani, no Manchester United, e Nuno Valente, no Everton.
Assistido pelo português em dois golos pelo Manchester United e autor de três passes para o capitão da seleção portuguesa marcar, Saha imaginou, desde cedo, que o então jovem colega iria protagonizar uma "grande carreira" e até vencer o prémio da FIFA para melhor jogador do mundo, o que aconteceu em 2008, 2013, 2014, 2016 e 2017, mas julgava ser impossível o avançado dos sauditas do Al Nassr estar onde está aos 40 anos, com 944 golos e mais de 30 troféus coletivos.
"Julgo que ninguém lá atrás acreditava que iria fazer o que fez. O que ele conseguiu é quase impossível. Como podemos imaginar alguém a conseguir o impossível? (...) Mesmo Portugal nunca tinha ganhado nada antes, apesar de ter tido muitos jogadores talentosos no passado. Cristiano foi um elemento fundamental para isso", disse, a propósito das vitórias lusas no Euro2016 e na Liga das Nações, em 2019 e em 2025.
Embora a primeira passagem pelo Manchester United tenha sido "perfeita" para Cristiano Ronaldo evoluir como jogador, entre 2003 e 2009, sob a orientação do treinador Alex Ferguson, o antigo dianteiro francês crê que o português completou a sua transformação em goleador no Real Madrid, clube no qual marcou por 450 vezes em 438 jogos oficiais entre 2009 e 2018.
"Quando temos alguém com tanta qualidade capaz de ouvir o seu corpo, de se aperceber da progressão mais ajustada e de a concretizar no mais alto patamar, no Real Madrid, o clube onde existe mais pressão, é algo espetacular. (...) Ele tinha o Bale, o Benzema e alguns outros grandes jogadores à volta, mas era ele que marcava a maioria dos golos. Sei o quão complicado é, para um jogador, mudar de perfil e quando o fazer. Exigiu tremenda competência", ressalva.