
Texto de opinião de Carlos Ramos, jornalista do portal brasileiro do zerozero.
Seja no 4-2-4 ou no 5-3-2, através de jogo de posição ou jogo funcional, respeitando as diversas formas de ver o futebol. Acreditando sempre na beleza do jogo, e nas diversas interpretações do mesmo. Falo de tática tentando fugir do professoral, mas sempre buscando ir além. Como em uma conversa de bar. Sem espaço para a saideira.
O Botafogo fez o que poucos esperavam: venceu o Paris Saint-Germain, em Pasadena, gol de Igor Jesus. Fiquei tentado a pedir ajuda ao Sobrenatural de Almeida, de Nelson Rodrigues, se é que ele por aí ainda está, mas preferi tentar buscar respostas nesse plano para o resultado. Do plano de jogo de Renato Paiva para derrubar o "Golias" à disciplina fiel dos jogadores em campo: foi uma noite perfeita do Alvinegro, para mostrar que ainda é tempo de Botafogo.
O jogo começou com uma decisão de Paiva: desfez o esquema de dois atacantes, tirando Mastriani do time para colocar Allan. 4-3-3, espelhando a plataforma tática inicial do rival. Na fase ofensiva, esse desenho é claro, e natural. Mas o que mais fez a diferença foi como o Botafogo defendeu em 4-3-3.
Vitinha era uma das grandes preocupações por parte dos botafoguenses. Foi um dos melhores jogadores da temporada na Europa, justificável. E Paiva certamente passou os últimos dias pensando em como anular esse jogador. E mais: como evitar que o PSG conseguisse construir superioridade numérica no corredor central.
A resposta veio na fase defensiva em 4-3-3. Ao avançar ao último terço, o PSG esperava que o Botafogo acompanhasse e baixasse as linhas, defendendo em 4-5-1. Mas Artur e Savarino continuavam próximos de Igor Jesus, fechando linhas de passe no corredor central. Esse movimento fez Vitinha ter menos influência no jogo. Vitinha é o pêndulo do PSG, se a bola não passar por ele...
Allan também foi importante nesse sentido. Por mais que a marcação fosse por zona, ficou sempre atento a Vitinha quando o PSG quebrava uma linha de passe para achar o português e aproximava a marcação, com algumas perseguições ao luso. Vitinha não conseguia baixar muito para fazer a saída a 3, com Lucas Hernandez fixo entre os zagueiros, e acabou sendo dominado no meio, mesmo quando conseguia criar linhas de passe.
Uma coisa que não funcionou bem no PSG também foi a rotação posicional que o time tão bem fez ao longo da temporada. Lucas Hernandez na lateral esquerda tirou um pouco essa possibilidade: o lateral não teve a mesma capacidade de Nuno Mendes para aparecer no último terço por dentro, nos meio-espaços. Kvara ficou sempre aberto e, por mais que fosse um perigo, sofreu para desequilibrar com as dobras de marcação da defesa botafoguense. Quando passou por Vitinho e o volante que fechava por ali, encontrou um Jair que fez uma partida perfeita. Impecável. Imaculada.
O Botafogo foi um time compacto até as alterações. Dos dois lados. Nuno Mendes deu imprevisibilidade na esquerda, e com Santi Rodríguez não mantendo a concentração de Savarino do outro lado, Hakimi conseguiu crescer no jogo, com trocas de posição com Doué e Kvara, que passou a cair por ali. Foram alguns minutos em que a marcação deixou de encaixar. Até o time baixar as linhas para os minutos finais.
O PSG deu dois passos para frente, mas não "subiu no ônibus". Bateu contra um muro segurado por Barboza, Jair, Gregore, Allan, e companhia. O Botafogo se manteve firme, fiel ao plano tático de Paiva e segurou o resultado. Diante de um rival pouco inspirado, fisicamente abaixo e tecnicamente menos preciso do que o costume.
Luis Enrique confessou após o jogo que o Botafogo foi o time que melhor marcou o PSG na temporada. O que faz sentido: nesta quinta, o PSG teve o terceiro pior xG (Expected Goals) da temporada, com 0,78, perdendo apenas para duelos contra Arsenal (derrota 2 a 0) e Bayern (derrota 1 a 0). E não bastasse a defesa perfeita...
O gol de Igor Jesus foi uma daquelas coisas que só acontecem ao Botafogo, coroando mais uma vez o melhor jogador do time. Aquele que brigou como o leão contra um exército de zagueiros. E que venceu a batalha que precisava para ganhar a guerra.
O Botafogo foi em 90 minutos contra o PSG tudo o que não havia sido no segundo tempo em Seattle. E tudo o que qualquer equipe brasileira precisa para vencer um rival europeu do nível do PSG. Não a quarta, quinta, sexta força do continente. Mas o rival de primeira prateleira, que foi nosso grande carrasco nos Mundiais recentes. Aquele que para vencer, precisamos de heróis como Gabiru, Mineiro, Guerrero, e Igor Jesus. E de uma noite perfeita, ou quase isso.