“Não estamos ao serviço de nenhum político, de nenhuma figura política, de qualquer causa ou tema”, reafirmou, esta quarta-feira, Jerome Powell, o presidente da Reserva Federal norte-americana (Fed) na conferencia de imprensa em Washington que se seguiu ao anúncio de um primeiro corte de juros robusto de meio ponto percentual (50 pontos-base).

Donald Trump, o candidato republicano às presidenciais de 5 de novembro, “não vai gostar nem um pouco disto”, comentou Edward Harrison, colunista da Bloomberg. O ex-presidente reagiu, de facto, numa visita a um bar em Nova Iorque numa paragem na campanha eleitoral. O corte robusto de juros "mostra que a economia está muito má, para cortar [as taxas de juros] tanto, assumindo que [a Fed] não está apenas a fazer política" em pleno período de campanha eleitoral. “Ou a economia está muito mal, ou estão a fazer política, ou uma coisa ou outra”, acentuou.

A reunião desta semana foi a última antes das presidenciais, com o próximo anúncio de política monetária a realizar-se logo dois dias depois de se conhecer o futuro presidente dos Estados Unidos a partir de janeiro de 2025.

Questionado sobre a importância da defesa da independência do banco central, Powell desenvolveu a resposta para além do habitual: “As democracias em todo o mundo, países que são como os Estados Unidos, têm bancos centrais independentes. A razão é que as pessoas descobriram ao longo do tempo que proteger o banco central do controlo direto por autoridades políticas evita fazer política monetária de uma forma que talvez favoreça os que estão no poder, em vez dos que não estão. Os dados são claros: os países que têm bancos centrais independentes têm inflação mais baixa. Nós fazemos o nosso trabalho para servir todos os americanos”. E concluiu: “É um bom arranjo institucional, que tem sido bom para os cidadãos. Espero e acredito firmemente que vai continuar”-

A próxima reunião vai decorrer a 7 de novembro e Powell não antecipou qualquer medida, reafirmando que as decisões são tomadas em cada reunião, uma postura similar à que repete, também, Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu.

No entanto, sem que sirva de orientação sobre a próxima reunião, as projeções médias dos membros do sistema da Fed, divulgadas esta quarta-feira, apontam para uma descida do intervalo da taxa diretora dos atuais 4,75% a 5% para um ponto médio no intervalo de 4,4% no final do ano. Essa trajetória pressupõe uma descida para o intervalo entre 4,25% a 4,5%, o que poderia englobar um corte acumulado de mais meio ponto percentual numa só reunião ou nas duas que faltam: a de novembro e outra a 17 e 18 de dezembro.

Não há sinais de recessão

“A economia [norte-americana] está em boa forma, sólida”, afirmou Powell, em contraste com muitas previsões pessimistas, ou mesmo catastrofistas na arena política, e temores de investidores de que os Estados Unidos caminham para uma recessão ou estagnação. “Não vejo nada na economia que sugira a probabilidade de uma recessão”, afiançou o presidente da Fed, que acrescentou: “O mercado laboral está em boa forma. O nível de emprego está perto do pleno emprego. Não há sinais de lay-offs”.

Nas projeções dos participantes do sistema da Fed, a economia deverá crescer, em média, 2% entre 2024 e 2027.

Esta visão do andamento da economia, em paralelo com um processo de desinflação (descida da inflação) que aponta para 2% em 2026, permitiu, explicou Powell, que o banco central tenha decidido esta quarta-feira anunciar “um grande passo” na política monetária ao iniciar o ciclo de corte de juros logo com uma descida de meio ponto percentual.

Mas Powell e a Fed não se comprometem com a sequência e velocidade futura. O presidente do banco central disse até que “não há nada [nas Projeções Económicas] que sugira que o Comitê [Federal de Mercado Aberto] esteja com pressa para o fazer”. .

Mas Wall Street não ficou satisfeita

Depois de uma reação inicial muito positiva ao corte de meio ponto percentual, os índices bolsistas em Nova Iorque envolveram-se em oscilações e acabaram por fechar no vermelho, depois de Powell garantir que a Fed não tem pressa e que os juros não regressarão aos níveis muito baixos em que excecionalmente estiveram em períodos como o da resposta à crise financeira e à pandemia entre 2008 e 2020. Acrescentou que “ninguém deveria olhar para esta decisão e dizer que este [o corte de 50 pontos-base] é o novo ritmo”.

Em Wall Street, o índice Dow Jones encerrou com uma perda de 0,3% e o S&P 500 com uma descida de 0,29%. Na bolsa das tecnológicas, o Nasdaq, a queda foi de 0,25%. São perdas ligeiras, mas que sinalizam que os investidores não ficaram eufóricos como seria de esperar depois da Fed ter alinhado a sua decisão com as expetativas do mercado.