A inflação na zona euro subiu para 2,4% em dezembro, de acordo com a estimativa rápida publicada esta terça-feira pelo Eurostat, o organismo de estatísticas da União Europeia. Em setembro, a inflação tinha baixado para um mínimo do ano, fixando-se em 1,7%, mas retomou, nos dois meses seguintes, uma trajetória ascendente para 2% e 2,2%.

Apesar desse movimento de subida desde outubro, o ano de 2024 fica marcado por um processo de desinflação, de descida da inflação, tendo arrancado o ano com um máximo de 2,8% e fechado 2023 com uma média anual de 5,4%. O pico do ciclo inflacionista registou-se em 2022, com uma inflação média anual de 8,4%.

Uma segunda estimativa será publicada pelo Eurostat a 17 de janeiro, já depois de se conhecer a primeira estimativa para a inflação em dezembro na economia norte-americana.

Não obstante a trajetória ascendente da inflação desde outubro, revelando um processo de desinflação classificado por Christine Lagarde como “aos solavancos”, com altos e baixos, o Banco Central Europeu (BCE) projeta uma inflação média anual de 2,4% em 2024. Na sua última reunião do ano passado, a 12 de dezembro, os economistas do banco central avançaram com um movimento de descida para 2,1% em 2025 e abaixo do objetivo de 2% da política monetária em 2026.

Deste modo, a expetativa é que o BCE não travará o processo de corte de juros em 2025, prevendo-se a primeira descida do ano já na reunião a 30 de janeiro.

A expetativa é que o BCE não travará o processo de corte de juros em 2025, prevendo-se a primeira descida do ano já na reunião de 30 de janeiro.

A subida do ritmo da inflação em dezembro foi impulsionada pela aceleração dos preços nos serviços, que regressaram a uma variação homóloga de 4%, e na energia que, depois de uma quebra homóloga em novembro, subiram 0,1% em dezembro.

A inflação subjacente - designação para a inflação excluindo as componentes mais voláteis da alimentação e energia - estabilizou em 2,7%.

Os ritmos de inflação referidos dizem respeito à variação homóloga, em relação ao mesmo mês do ano anterior.

Na variação em cadeia, de um mês para o seguinte, o índice geral subiu 0,4%, com impulsos dados pela subida de 0,8% nos serviços e de 0,6% na energia.

Recorde-se que os serviços estão a ser pressionados pela subida dos salários e que, na energia, as matérias-primas viram as cotações aumentar 1,8% nos últimos três meses. Cite-se, a título de exemplo, que, na Alemanha, os salários com impacto nos serviços subiram, em termos homólogos, de 4% em novembro para 4,1% em dezembro.

Inflação a várias velocidades

A inflação na zona euro não é homogénea. A variação para Portugal situou-se em 3,1% (em termos de índice harmonizado, usado pelo Eurostat), acima da média de 2,4% para a zona euro e de 2,8% para a economia nossa vizinha, Espanha. Na medição do Instituto Nacional de Estatística, em Portugal, subiu de 2,5% em novembro para 3% em dezembro.

A variação das taxas de inflação vai das acima de 4% para a Bélgica, Croácia e Estónia, até às inferiores a 1,5% registadas na Irlanda e Itália. Em seis economias do euro - Finlândia, França, Irlanda, Itália, Lituânia e Luxemburgo -, a inflação é já inferior ao objetivo de 2% da política monetária.

A implicação desta heterogeneidade é que as taxas reais de juro do BCE são diferentes em cada um dos 20 membros do euro. Apesar da taxa nominal de referência do BCE estar em 3%, as taxas reais, descontando a inflação, são muito diferentes, sendo mais restritivas nas economias em que a inflação está abaixo dos juros do BCE, e menos restritivas nas em que a inflação está acima dos juros do BCE. Uma inflação mais alta do que os juros do BCE (em 3% atualmente) torna o juro real negativo.

BCE deverá acelerar cortes

Na política monetária previsível para 2025, entre os sete principais bancos centrais, de que se dispõe de previsões, o BCE deverá destacar-se na aceleração do ritmo de cortes e na dimensão da descida acumulada esperada para este ano.

Nas expetativas avançadas pelo portal MacroMicro, a taxa de referência do BCE deverá descer dos atuais 3% para 1,6% no final do ano, um corte acumulado de mais de 130 pontos-base, superior aos 100 pontos-base cortados em 2024. As projeções da MacroMicro vão para além da previsão dos economistas do banco alemão Commerzbank que aponta para quatro descidas até 2% nas reuniões de 30 de janeiro (a primeira do ano), 6 de março, 17 de abril e 5 de junho e uma descida acumulada de 106 pontos-base no primeiro semestre do ano (pouco mais de 1 ponto percentual de corte acumulado).

Os pressupostos desta trajetória de descida sucessiva baseiam-se na previsão de Christine Lagarde, a presidente do BCE, de que, ao longo de 2025, a inflação na zona euro atingirá o objetivo de 2%. Esta descida dos juros é crucial para a Alemanha, que vai a votos a 23 de fevereiro num clima em que 20 das 49 associações empresariais estão pessimistas sobre o crescimento, e para a França, envolta em crise política, e com dificuldade de reduzir o défice orçamental abaixo de 6,1% do PIB estimado para 2024. O atual ministro francês da Economia, Eric Lombard, nomeado para o novo governo chefiado por François Bayrou, fala de um défice para 2025 entre 5% e 5,5%.

Contudo, as decisões do BCE vão depender de quatro fatores importantes em 2025. O primeiro, a possibilidade da China “exportar” para a Europa deflação face à guerra comercial com a Administração Trump, como assinalou Klaas Knot, presidente do Banco Central dos Países Baixos. O segundo, o BCE ser forçado a travar cortes devido a um disparo dos preços da energia ou a uma depreciação mais acentuada do euro, avisou Robert Holzmann, governador do Banco Central da Áustria e considerado o mais ‘falcão’ (crítico das políticas monetárias expansionistas, nomeadamente de uma descida excessiva dos juros) da equipa atual de Lagarde. O terceiro, o impacto direto do protecionismo de Trump com consequências inflacionistas na zona euro, obrigando a uma paragem dos cortes de juros, como referiu Boris Vujcic, governador do Banco Central da Croácia.

Também poderão acelerar o ritmo de cortes o Banco Popular da China (PBOC) e o Banco de Inglaterra (BoE), Na projeção da MacroMicro, os juros do BoE poderão ser cortados em 75 pontos-base ao longo de 2025, mais do que os 2 cortes de 2024 num total acumulado de 50 pontos-base. Segundo a Bloomberg, referindo previsões da Goldman Sachs e da Morga Sntanley, o PBOC deverá descer a taxa de referência de 3,1% para 2,7%,uma descida ligeiramente superior à de 2024, podendo implicar três cortes em vez de só dois como no ano anterior. O PBOC já avançou que, em 2025, pretende mudar de uma política monetária “prudente” (com cortes tímidos) para uma de alívio moderado. A política monetária e a política orçamental (pelo governo) chinesas vão sincronizar-se para travar a desaceleração económica e o risco de deflação (com a inflação a cair para 0,2% em novembro de 2024).

Nos EUA, prudência no horizonte

As projeções do portal MacroMicro para a evolução da taxa de referência da Reserva Federal norte-americana (Fed) apontam para uma descida modesta em 2025 abaixo de 40 pontos-base, menos de metade do corte acumulado em 2024 (100 pontos-base). Na projeção avançada, o ponto intermédio do intervalo das taxas de juro desceria apenas para 3,9%. Atualmente está em 4,4% no intervalo em vigor entre 4,25% a 4,5%.

A Fed reúne-se já a 29 de janeiro, na semana seguinte à tomada de posse de Donald Trump,e um dia antes da primeira reunião do ano do BCE. Os futuros da taxa de referência apontam para uma probabilidade de quase 90% no sentido da equipa chefiada por Jerome Powell não mexer no intervalo dos juros. Como o próprio Powell já assinalou, a Fed vai necessitar de conhecer as políticas concretas da nova Administração para poder avaliar os seus impactos. Só na segunda reunião do ano, a 19 de março, os banqueiros centrais do dólar atualizarão as suas previsões macroeconómicas (crescimento, inflação e desemprego) e sobre a taxa de juros do banco central, já contando com três meses de presidência Trump.

O primeiro corte em 2025 pela Fed deverá ficar adiado para a reunião de 7 de maio, segundo as probabilidades implícitas nos futuros na plataforma FedWatch da CME. Aos três cortes realizados em 2024, o ritmo poderá descer abruptamente para apenas uma descida em todo o ano de 2025.

Também o Banco do Canadá deverá moderar a descida de juros. De um corte acumulado de 175 pontos-base em cinco decisões em 2024, o portal MacroMicro aponta para uma descida de pouco mais de 60 pontos-base até final de 2025.

Em sentido contrário, o Banco do Japão deverá realizar 2 a 3 subidas durante 2025, puxando os juros dos 0,25% atuais para 0,7%. O aumento acumulado deverá ser ligeiramente superior ao do ano passado. Um inquérito da CNBC apontava para uma probabilidade superior a 50% de um primeiro corte do ano já na reunião de 24 de janeiro.

Entre as economias emergentes, o Banco Central do Brasil iniciou um processo de aperto nos juros (subida da taxa Selic) no segundo semestre do ano passado. O Relatório Focus do próprio banco central aponta para uma subida da taxa dos 12,25% atuais para 14,75% no final de 2025, com um aumento de 100 pontos-base já a 29 de janeiro e uma segunda subida de mais 100 pontos-base em março, guardando o último ajustamento para final do ano.

Nota: Foi corrigida na versão inicial a data da próxima reunião do Banco Central Europeu, que não é a 5 de fevereiro, mas a 30 de janeiro, bem como o restante calendário de reuniões de política monetária do BCE no primeiro semestre de 2025.