
A mostra está instalada na ala Álvaro Siza do Museu de Serralves, uma das muitas ligações entre os dois arquitetos, e coloca em foco um dos nomes mais influentes do século XX, sobretudo do período entre guerras mundiais, patente até 04 de janeiro do próximo ano.
"Há um investimento dos três [Alvar, Aino e Elissa] num corpo de obra que vem dos anos 1920 até 1994, ano da morte da segunda mulher [Elissa Aalto, 1922-1994], que termina postumamente alguns projetos de Alvar. Temos 31 projetos, nos 31 anos da morte de Elissa, e assinalamos os 50 anos [da morte do arquiteto], que serão em 2026, quando termina a exposição", explica à Lusa o curador, António Choupina.
O diretor de Arquitetura da Fundação de Serralves, que desenhou a mostra em colaboração com o Museu Alvar Aalto, na Finlândia, nota como as duas mulheres de Alvar Aalto "geriam, na prática, o escritório", enquanto o arquiteto participava em congressos internacionais, dava aulas no Massachussets Institute of Technology (MIT) e fazia outras atividades que dinamizavam a atividade do estúdio.
No período entre guerras, desenhou edifícios emblemáticos, como o Sanatório de Paimio, uma resposta à gripe espanhola do início do século, tendo em conta a salubridade, iluminação e outras necessidades dos enfermos, mas também "lavatórios silenciosos, em que a água toca na cerâmica num ângulo específico".
A criação da Artek, loja própria de mobiliário e design de onde saíram várias peças que hoje são conhecidas do público em geral (os bancos 'empilhados', redondos e com pernas alçadas, são disso exemplo), é outro dos marcos do trabalho deste estúdio.
Tido como discreto e menos afamado a par de outros contemporâneos, como Le Corbusier ou Frank Lloyd Wright, o finlandês protagonizou, com a primeira mulher, Aino Marsio-Aalto (1894-1949), "o primeiro 'power couple' do mundo da arquitetura", tendo desenhado o pavilhão da Finlândia para as Expo de Paris e Nova Iorque, tornando-se "figuras bastante conhecidas no meio".
O impacto que tiveram sentiu-se também em Portugal, e Choupina conta que Álvaro Siza, quando instruído a comprar revistas do setor, adquire em 1950 um exemplar da L'Architecture d'Aujourd'hui a ele dedicada.
"Vai influenciar imenso a sua obra. [Mais tarde, em 1988] ganhará a medalha Alvar Aalto, uma peça que estará aqui na exposição, aliás. Para Siza, é uma figura seminal. Os Aalto, naquele período, inventaram uma linguagem contemporânea para a jovem Finlândia do pós-guerra. Era, no fundo, o que procuravam os jovens arquitetos em Portugal, também", analisa o curador.
Essa vontade de "criar uma identidade portuguesa de uma arquitetura que fosse moderna mas, ao mesmo tempo, local", com materiais e técnicas típicas do país, liga os dois arquitetos numa mesma "ideia otimista de que um bom desenho pode transformar o mundo", sobretudo no espírito do 'Homem Novo' que guiou o período pós-guerra na Europa.
"Pareceu-nos importante, desde início, que ambas as esposas figurassem na exposição com a mesma equidade de Alvar. Daí o título da exposição ser apenas 'Aalto'. Na realidade, são elas que garantem que a obra é feita e continua", acrescenta.
Esse trabalho contínuo, até depois da morte de Alvar, é aqui realçado até no roteiro da exposição, que termina na Igreja de Santa Maria da Assunção, em Riola di Vergato, Itália, acabada postumamente.
Até lá, são 15 salas com projetos de museus no Iraque e no Irão, bibliotecas por todo o mundo, a Ópera Aalto em Essen, na Alemanha, igrejas, complexos habitacionais, universidades, fábricas e até uma redação de jornal, do Turun Sanomat em Turku, passando por trabalhos mais conhecidos como a Casa Louis Carré ou a Biblioteca Viipuri.
Um corpo de trabalho extenso e diversificado que Serralves retrata até ao pormenor do barco com um motor "tão pesado" que se tornou emblema da crise de meia-idade do arquiteto.
"Ele tem uma espécie de crise de meia idade, mas em vez de uma mota, comprou um barco com um motor tão pesado que a parte da frente levantava. A maquete do barco também estará na exposição. Chamou-lhe: 'Ninguém é profeta na sua terra', em latim ['Nemo propheta in patria']. Se alguém foi profeta na sua terra, na minha opinião, talvez tenha sido mesmo Alvar Aalto", assegura o curador da mostra.
Além da profusão de projetos para edifícios, Serralves criou "uma instalação, numa parede curvilínea, inspirada pela aurora boreal, como era o caso dos Aalto", uma vez que este nome significa, no nome da família, 'onda', o que talvez prove que "a qualidade curvilínea da obra não será casuística".
"Era algo que Alvar Aalto fazia [com o barco]: criava ondas nos lagos para que as crianças pudessem brincar", conclui Choupina.