Gustavo Carona tornou-se um nome e rosto que certamente irá recordar se recuar até 2020. Numa época em que o medo e a incerteza reinou, o médico tornou-se um dos que ajudou a salvar dezenas de vidas quando enfrentámos a pandemia contra a Covid 19. Num tempo tão recente e, que ao mesmo tempo, se tornou tão distante.

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Foi precisamente quando a pandemia começava a abrandar que o seu corpo começou a dar sinais. Inicialmente, dores ciáticas e uma tristeza que não compreendia. O primeiro diagnóstico foi de burnout,. Contudo, a dor agravou-se e tornou-se permanente. Rapidamente o médico percebeu que estava a braços com uma doença grave, crónica, incurável, que lhe provoca dor neuropática permanente. Hoje, Gustavo Carona vive confinado ao seu quarto e preso a uma cama.

Foi ali mesmo, na cama, que o médico da linha da frente recebeu Júlia Pinheiro, para contar sobre a sua batalha que hoje o impede de exercer medicina.

“São diferentes camadas de luto. Quando eu saio do hospital, nunca chorei tanto na minha vida, mas eu tinha tanta dor que não conseguia continuar. Enterrar a minha prática clínica foi duríssimo, depois foi enterrar a minha capacidade de socializar, depois foi enterrar a minha capacidade de querer viver“, contou em conversa com a apresentadora da SIC. Viver com dor permanente tem sido tão doloroso para o médico que assume já ter pensado várias vezes em pôr termo à vida.

“Tive um ano em que praticamente fui vegetal”

“Em finais de 2023 tive várias crises de dor que me levaram a ter de assumir que estava muito perto do risco de suicídio e foi a maior pancada que eu levei na minha vida. Mas pedi sempre ajuda quando estive perto de o fazer. Mas se não fosse pelo amor à minha mãe e minha irmã, se não fosse sentir-me egoísta hoje não estava aqui. Acho que temos que andar aqui para sermos felizes e carregar uma cruz não me parece ser um objetivo de vida. Quando o nosso corpo é o nosso inimigo é desesperante. Uma doença em agravamento cada vez a tirar-nos cada vez mais a capacidade de sorrir e ter momentos de felicidade é ingerível. Só me segurei porque achei que iria matar a minha mãe e a minha irmã se o fizesse.”

“Tive um ano em que praticamente fui vegetal, no sentido em que tinha tanta dor que nem conseguia raciocionar. Felizmente, há três meses fiz uma cirurgia que me permitiu respirar. Estou muito longe de estar bem. Eu costumo dizer que passei do desesperado ao péssimo e quando assim é o péssimo parece bom, mas o péssimo continua a ser péssimo. Ainda tenho muitas dificuldades em gerir a minha capacidade de viver, mas consigo respirar. O mais difícil é conseguir viver com dor 24 horas por dia”, revelou ainda.

Apesar de continuar a dedicar-se a causas humanitárias, através da sua conta de Instagram, Gonçalo Carona assume o quão duro é abdicar do que mais gosta: mudar vidas no terreno.

“É agridoce dedicar-me ao meu sonho humanitário porque todos os dias estou a abrir uma ferida muito dolorosa, do que eu queria ser e já não sou: médico no sentido clínico”.

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Texto: Ana Rocio Fotos: redes sociais