“Mas os pais deviam estar sempre de acordo.” Esta é uma ideia que escuto muitas vezes em sessões de terapia. Parece haver uma crença de que a harmonia conjugal, no que diz respeito à educação dos filhos, depende da uniformidade, da tal “voz única” que nunca entra em desacordo. a “que nunca entra em conflito”.
É compreensível. Todos desejamos estabilidade emocional e congruência, contudo, quando a exigência de uniformidade se sobrepõe à autenticidade de cada um, o que era para ser um solo firme pode tornar-se um campo minado. A verdade é que não precisamos de ser iguais para educar juntos. Precisamos, sim, de respeito, escuta e alinhamento nos limites essenciais.
Os estilos parentais não são todos iguais e ainda bem. A psicóloga Diana Baumrind, uma referência na psicologia do desenvolvimento, identificou quatro grandes estilos parentais, que se distinguem pelo grau de exigência e de responsividade emocional: autoritário, permissivo, negligente e democrático. Este último tem sido associado a melhores resultados no desenvolvimento infantil, pela forma como equilibra estrutura e empatia.
Mas, na vida real, nem sempre os cuidadores partilham o mesmo estilo. Um pode ter uma tendência mais diretiva, outro pode privilegiar mais o diálogo. E o que poderia ser apenas diferença de perspetiva transforma-se, muitas vezes, em conflito conjugal.
Discutem-se regras, horários, formas de lidar com birras ou castigos. Um sente-se “o rígido”, o outro “o permissivo”. E em muitos casos, surge a desautorização mútua, às vezes silenciosa, outras vezes em frente às crianças. Quando os estilos parentais se tornam fontes de tensão, é comum surgir a sensação de solidão parental. Um dos cuidadores sente que carrega o peso da estrutura, enquanto o outro se vê como o único a oferecer afeto. Mas esta divisão é ilusória e perigosa. Porque ambos estão, provavelmente, a tentar o mesmo: proteger os filhos, dar-lhes o melhor que sabem e conseguem. O que falta, muitas vezes, não é alinhamento absoluto. É espaço para diálogo. É a validação de que podemos ser diferentes sem sermos adversários. O essencial não é que os pais concordem em tudo. É que tenham balizas claras sobre o que é negociável e o que não é. Que possam ter conversas difíceis fora do olhar dos filhos. Que estejam, aos olhos das crianças, numa relação que se respeita, mesmo quando diverge. Os filhos não precisam de pais iguais, precisam de pais em relação. Há algo profundamente educativo em ver dois adultos que pensam de forma diferente, mas que se escutam. Que ajustam, cedem, reparam, encontram soluções. Esta experiência modela nos filhos a ideia de que o conflito pode ser construtivo e que a diferença não é uma ameaça. Educar em conjunto não é sobre fusão de estilos. É sobre coesão relacional. É sobre poder dizer: “Eu não faria assim, mas entendo o que te move. Vamos encontrar um meio-termo que proteja a criança — e também a nossa relação.”
Porque, no fim, o maior exemplo que damos aos nossos filhos... é a forma como nos relacionamos.”
(catarinagomesterapeuta@gmail.com)


Catarina Gomes, Psicóloga, Terapeuta Familiar e de Casal