O número, avançado à agência Lusa pela responsável de Comunicação e Relações Externas da Portugal com ACNUR (Alto Comissariado da ONU para os Refugiados), Joana Feliciano, mostra um "agravamento das tragédias humanas" e da necessidade de ajuda humanitária.
Atualmente, "temos mais de 122 milhões de pessoas deslocadas à força", avançou a responsável, adiantando que este número contempla pessoas com o estatuto de refugiados, requerentes de asilo, apátridas e pessoas deslocadas internamente.
Estas pessoas são "vítimas do intensificar dos conflitos, das violações dos direitos humanos, de perseguições", mas também de "um crescente impacto das alterações climáticas", alertou Joana Feliciano, acrescentando que o clima está a provocar crises humanitárias sobretudo em países e regiões como Moçambique, Sahel, a região do Corno de África ou Myanmar.
"Sabemos que, em 2025, vamos precisar de 10 mil milhões [de euros] a nível global para conseguir garantir respostas humanitárias no terreno e, em particular, para as emergências que carecem de maior financiamento, nomeadamente a Ucrânia, o Líbano, a Etiópia e o Sudão", mas também "Myanmar, Afeganistão e Síria", avançou a responsável.
"O fosso entre as necessidades e a resposta humanitária é gigante", admitiu, reconhecendo que a situação se tornou mais crítica desde que a nova administração dos Estados Unidos, liderada pelo Presidente Donald Trump, decidiu "'pausar' durante cerca de 90 dias a Agência de Desenvolvimento Externa".
A Casa Branca publicou, na segunda-feira, uma ordem executiva que congela, durante 90 dias, a ajuda externa fornecida pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID na sigla em inglês), o maior doador individual do mundo.
Segundo o Presidente dos EUA, a decisão deve-se à necessidade de tentar expulsar os "extremistas loucos" que alegadamente dirigem a agência, responsável, no ano passado, pelo fornecimento de 42% de toda a ajuda humanitária das Nações Unidas no mundo.
"Isto vai, naturalmente, impactar também o ACNUR, já que os Estados Unidos é um dos principais financiadores para a ajuda humanitária", alertou a responsável.
"O Sudão vai precisar de muita resposta em 2025", garantiu, lembrando que, desde o início dos conflitos, em abril de 2023, mais de 12 milhões de pessoas fugiram do local onde viviam e o número pode aumentar "para mais de 16 milhões".
Também o Afeganistão é um dos destaques da responsável, não só porque o país vive há mais de três anos as perturbações associadas à tomada do poder pelos talibãs, em agosto de 2021, mas porque "os afegãos continuam a debater-se com uma crise económica terrível, com os impactos crescentes das alterações climáticas e com a diminuição dos direitos e liberdades, em particular das mulheres e raparigas".
O ACNUR debate-se ainda com outras emergências prolongadas como a de Myanmar, onde, "sete anos depois de 750 mil [pessoas da comunidade] rohingya terem fugido da repressão violenta no estado de Rakhine, a situação continua a piorar", ou como a da República Democrática do Congo, onde o escalar da violência continua e "já provocou mais de 400 mil pessoas deslocadas" desde o início de 2025.
"Estamos a falar de quase o dobro de pessoas deslocadas relativamente a todo o ano de 2024, em apenas um mês e poucos dias", sublinhou.
Depois, entre os casos mais recentes de necessidade de ajuda, destaca-se a Síria, onde o grupo Hayat Tahrir al-Sham liderou uma ofensiva-relâmpago que derrubou o regime de Bashar al-Assad no início de dezembro passado e onde agora "é preciso apoiar os que querem voltar a casa".
"Estamos a perspetivar que, não só na Síria mas a nível global, seja necessário garantir a proteção e apoio a 2,9 milhões de refugiados que pretendem ser reinstalados e que retornam, muitos deles, aos seus países de origem", estimou.
"Infelizmente, podia destacar muito mais emergências, nomeadamente a da Ucrânia, que já tem quase três anos, e falar de 6,7 milhões de refugiados deslocados internos, mas são muitos números e muitas carências", disse, destacando que, mesmo com tantas situações a que dar atenção, o ACNUR tem de estar sempre preparado para os imprevistos.
"Temos de abastecer os nossos armazéns e também dar formação ao pessoal, porque, em qualquer momento pode ser declarada uma nova emergência ou a necessidade de reforço da resposta humanitária", referiu a responsável.
"Cerca de 300 milhões de pessoas no mundo necessitam de assistência humanitária e proteção, entre as quais as mais de 140 milhões que se perspetiva constituírem o grupo de deslocados à força", sublinhou a representante da Portugal com ACNUR, apelando à solidariedade dos governos e das pessoas para garantir que a resposta humanitária não é cortada.
PMC
Lusa/Fim