
Não será todos os dias que Nuno Borges vê um jogo seu ter honras de minuto a minuto numa publicação estrangeira. Aconteceu nesta 2.ª ronda de Wimbledon, no site do “Isle of Man Today”, jornal da pequena ilha do Mar da Irlanda. Do outro lado estava Billy Harris, nascido em Inglaterra, mas habitante na dependência britânica, mais habituada a ciclistas e a motociclistas do que a tenistas.
Era a primeira vez de Harris na 2.ª ronda de Wimbledon, talvez daí a atenção dos seus conterrâneos. Veterano no passaporte (30 anos), mas nem tanto na experiência (esta é apenas a sua segunda presença no quadro principal no All England Club), o 151.º do mundo parecia um adversário ao alcance de Nuno Borges, ainda que a relva, ou a falta de treino nela, possa ser sempre um equalizador quando se joga frente a um britânico.
Assim não foi: o tenista maiato, número 37 do ranking, está pela primeira vez na 3.ª ronda de Wimbledon, ele que, até esta semana, nunca tinha vencido sequer um encontro na catedral da relva. O triunfo em três sets de dificuldade crescente (6-3, 6-4 e 7-6, com 9-7 no tie-break) tornam o número 1 nacional também o primeiro português a chegar pelo menos à 3.ª ronda de singulares nos quatro torneios do Grand Slam. O objetivo é agora igualar João Sousa, que chegou à 4.ª ronda em Wimbledon em 2019, derrotado então por Rafael Nadal.
O primeiro set foi aquele em que o português se apresentou em melhor nível, forte no serviço e quebrando cedo Harris, com notórias dificuldades em trocas de bolas mais longas. As poucas janelas de oportunidades para o britânico surgiram por erros de Borges (Harris desaproveitou break point com 3-1 no marcador), mas nunca o parcial esteve fora do controlo.
Mesmo sem grandes argumentos técnicos, Billy Harris elevou o nível no segundo parcial, mostrando-se mais disponível para alongar pontos, respondendo melhor aos ângulos abertos por Borges. Mais uma vez, o português quebrou cedo o adversário, mas defender a vantagem deu muito mais trabalho. Com 3-2 no marcador e Borges a servir, Harris desbaratou quatro pontos para devolver o break, num jogo que se estendeu por mais de 10 minutos. Nuno fecharia o 2.º set em 6-4, em 54 minutos.
O equilíbrio acentuar-se-ia no 3.º, que só se resolveu num tie-break que traria a qualidade técnica e a emoção que quase sempre faltou ao encontro. Quase sempre atrás do resultado, Borges conseguiu responder aos mini-breaks de Harris, que chegou a ter dois set points. Foi na iminência de perder o terceiro parcial que Borges assumiu a condução do jogo, transformando dois set points do adversário em dois match points a seu favor. Harris salvaria o primeiro, no serviço de Borges. O segundo, no saque do britânico, cairia mesmo para o português.
Segue-se Khachanov
Tal como na primeira vitória na relva de Wimbledon, frente a Francisco Cerundolo, a emoção tomou conta do habitualmente plácido Nuno Borges. O omnipresente boné voou da sua cabeça e seguiram-se longos cumprimentos com a sua bem composta box.
Num torneio de Wimbledon em que os cabeças de série têm caído a uma velocidade estonteante - 13 no quadro masculino e 10 no feminino só na 1.ª ronda - abre-se uma oportunidade para o jogador português fazer um resultado histórico. Na próxima ronda, o adversário será o russo Karen Khachanov, 17.º cabeça de série, mas que teve muitas dificuldades para derrotar o qualifier Shintaro Mochizuki na 2.ª ronda, precisando de cinco parciais para ultrapassar o japonês. Khachanov foi, curiosamente, o primeiro adversário de Nuno Borges num quadro principal de um Grand Slam, em Roland-Garros 2022. Venceu então em quatro sets, mas hoje o maiato é outro jogador, com mais experiência e com uma posição sólida no top 50 ATP.
Derrotando Khachanov, Borges terá garantido na 4.ª ronda um adversário com um ranking mais fraco que o seu. Mas, aconteça o que acontecer, Nuno Borges continua a sua boa sequência nos quatro principais torneios do calendário: desde que caiu na 1.ª ronda de Wimbledon há um ano que não faz pior que 3.ª ronda.