
Ring, ring!!!!!!!!! São cinco da manhã e o despertador abre os olhos de Mario Ilich para um novo dia. Vai ao ginásio e três horas depois inicia o circuito pelas lojas das redondezas. Quem estiver com falta de Coca-Cola, é a este vendedor que a deve pedir. Trabalha até às 17h e depois segue para o treino. Só regressa ao ponto de partida às 21h. O corpo extenuado pede-lhe descanso, mas este ano não vai de férias com a companheira. Até para viajar para o Mundial de Clubes com o Auckland City foi obrigado a pedir uma licença sem vencimento.
A equipa neozelandesa chegou com tempo aos Estados Unidos, onde vai jogar em estádios a rondar os 30.000 lugares dos quais só 50 serão preenchidos por adeptos kiwis. Angus Kilkolly, outro jogador, ficou fascinado com a Casa Branca. “Muitos de nós nunca tínhamos vindo aos Estados Unidos”, revelou à BBC. A antecedência com que chegaram aos Estados Unidos deu para os jogadores fazerem algum turismo antes de se dedicarem ao part-time que têm em comum.
Os jogadores do Auckland City são vendedores da Coca-Cola profissionais, barbeiros profissionais, agentes imobiliários profissionais, professores profissionais, lojistas profissionais, e futebolistas apenas quando podem.
Por certo, não era neste grupo de amadores que Gianni Infantino estava a pensar quando se propôs a juntar as 32 melhores equipas do mundo. No entanto, seria sempre difícil ignorar o 13 vezes campeão da Oceânia. As vidas duplas dos jogadores do Auckland City destoam a voluptuosidade do torneio que vai distribuir mil milhões de dólares em prémios monetários. $3,58 milhões ficarão para os neozelandeses. É um montante que, por agora, não apaga o desnível competitivo perante o Bayern Munique, o Benfica e o Boca Juniors, adversários no grupo C.
“É uma história de David contra Golias. Não sabemos o que vai acontecer, mas estamos extremamente orgulhosos por estar nesta competição. Há muitas emoções envolvidas em grandes jogos de futebol como estes”, disse Adam Mitchell, o vice capitão. “Nós representamos os 99% de clubes do mundo que são amadores.”
Conor Tracey, guarda-redes para quem o futebol também é uma sinecura, leva a vida a conduzir uma empilhadora num armazém de fármacos para animais. Ao portal neozelandês “Stuff”, lamenta que vá “sofrer um pouco” para pagar “a renda, as contas e essas coisas”. Só que jogar no Mundial de Clubes vale “100% a pena”.
Se noutras situações a organização teve que fazer alguma ginástica para incluir equipas que convinha estarem no Mundial de Clubes - o Inter Miami apurou-se por ter sido o clube com melhor desempenho na fase regular da MLS em 2024, enquanto que o campeão desse ano, o LA Galaxy, ficou de fora -, neste caso, o difícil foi verem-se livres do Auckland City. E eles aí estão para trazerem uma ponta de humildade a toda a excentricidade.