
É dia de Libertadores, o Barcelona de Guayaquil recebe o Corinthians. Do túnel sai aquele traje branco e negro, elegante, impecável. O público exulta. Mas não, não é por causa da tradicional camisola da formação brasileira, histórico alvinegro, que pousou em tempos idos na pele de Sócrates, Rivelino ou de Ronaldo nos últimos anos da carreira do Fenómeno. O povo reage porque entrou na arena Segundo Castillo, treinador do Barcelona equatoriano, dono do oficioso título de técnico mais estiloso do futebol mundial.
Nesse dia 5 de março, em jogo de pré-eliminatória da mais importante competição de clubes da América do Sul, Castillo esmerou-se: fato de três peças, com direito a colete e casaco branco com pormenores a preto, calças negras e laço. Sapato imaculado, brilhante. Segundo Castillo está num jogo de futebol, enérgico a dar indicações, mas podia estar numa qualquer gala. Na 2.ª mão, em São Paulo, o antigo médio internacional pelo Equador vai mais comedido em termos cromáticos, mas não menos chique, optando por tons mais negros e cinzentos.
É possível que o auge estilístico tenha acontecido esta semana: na terça-feira, já na fase de grupos da Taça Libertadores, o Barcelona SC viajou até a um dos mais míticos estádios das Américas, o Monumental de Núñez, casa do River Plate, em Buenos Aires. Segundo Castillo, de 42 anos, surge nas imagens num arrojado fato totalmente cor-de-rosa , três peças novamente e um já inconfundível laço. Com o estádio do River Plate interditado, das bancadas vazias não veio a merecida reação face a tamanha audácia.
Há muito que boa parte dos treinadores deixou a proverbial roupa desportiva no banco para optar por elegantes fatos. Longe vão os artigos sobre o estilo aprumado de Mourinho, dos seus trajes Armani. Hoje, já nem fazem sentido, porque se tornou regra. Mas Segundo Castillo vai mais longe. Cada jogo é uma cerimónia, uma gala, um evento especial. E ele garante que assim se veste porque as ocasiões solenes são para respeitar.
Vestido para estar à altura
Segundo Castillo era um médio poderoso, com passagens pela Premier League, no Everton e no Wolverhampton, depois de brilhar no Estrela Vermelha de Belgrado, primeiro clube europeu que o recebeu após começar a carreira no Espoli e no El Nacional do seu país. Foi um dos centrocampistas titulares do Equador no Mundial de 2006 e só não jogou no Campeonato do Mundo de 2014 devido a uma lesão poucos dias antes do início da competição. Dono de um poderoso remate de meia-distância, é daí que vem uma das suas alcunhas: “El Mortero.”
A pouca subtileza do seu jogo enquanto futebolista não se transpôs para o estilo do seu guarda-roupa agora como treinador. Segundo já não é o Morteiro, mas sim o Sir Second Castle, uma tradução quase aristocrática para o seu nome em castelhano.
Mas questionado sobre as suas escolhas de alfaiataria, sempre um nível acima na escala da formalidade a que estamos habituados num jogo de futebol, Segundo Castillo não se espraia demasiado. “Acredito que uma pessoa tem de estar à altura do lugar, nada mais. E por isso trato de deixar uma boa imagem para os meus jogadores e para o público”, sublinhou em entrevista ao jornal equatoriano “Extra”, assegurando que os seus modelitos não são tão caros quanto parecem.
Ao diário argentino “Olé”, Castillo elaborou um pouco mais, frisando a solenidade com que olha para o momento que o Barcelona SC está a viver e a solenidade com que espera que os jogadores o encarem. “A Libertadores é a nossa Champions League e por isso é preciso estar à altura do torneio. Olhas para os treinadores que estão na Champions e todos estão bem apresentados. Também quero ser competitivo nessa parte, para criar identidade nos nossos jogadores”. Um fato espampanante, afinal, também pode ser uma forma de mind games.
Técnica de motivação
Segundo Castillo não será o treinador com as técnicas mais ortodoxas na hora de levantar o ânimo às tropas. Finalmente escolhido no início desta época como treinador principal do Barcelona SC depois de um par de experiências como interino, o antigo internacional, que também jogou no clube, aposta nas conversas motivacionais, arreigadas na fé que transporta. Elas são ministradas por gente tão diferente como um pastor evangélico ou o lutador do UFC Marlon Vera. A salsa está sempre presente no balneário.
Castillo garante que as suas opções de moda têm também o condão de relaxar os jogadores. “Quando apareço roubo-lhes sempre um sorriso. Tentamos que se libertem um pouco, nem que seja um segundo”, revelou ao “Olé”.
E tem resultado: o Barcelona SC lidera o campeonato equatoriano em igualdade com o Vinotinto, mas com menos dois jogos que o rival. Na Libertadores, depois de passar duas fases de qualificação, é 2.º no Grupo B, com os mesmos quatro pontos do River Plate, com quem empatou em Buenos Aires, um bom resultado face a um dos históricos da América do Sul - onde, no entanto, o jogo demasiado conservador da sua equipa, contrariando o seu fato cor-de-rosa, seria criticado.
A extravagância de Segundo Castillo, diga-se, já ultrapassou as fronteiras do futebol e o equatoriano foi mesmo destaque recente na edição italiana da revista “Vogue”, que, falando da farpela preta e branca que o treinador escolheu para o jogo com o Corinthians, sublinhou o “look elegante e fora do comum”, afirmando mesmo que “nenhum treinador de futebol alguma vez se vestiu assim”. A “Vogue” diz mesmo que Segundo Castillo estaria “perfeito” para assistir à Met Gala, que se realiza em 2025, local privilegiado onde todos os que querem marcar a moda querem estar e que este ano tem como temática “Black Dandy”. Talvez ainda lhe chegue o convite dourado às mãos.