Na busca contínua por resultados no tratamento da obesidade, por vezes esquecemos que o verdadeiro objetivo do tratamento não é apenas a redução dos números numa balança, mas a melhoria da qualidade de vida e o controlo do peso e das doenças associadas a longo prazo. Daqui advém o célebre aforismo de que “perder peso é fácil, difícil é manter a perda de peso”.
Para compreendermos a assertividade desta expressão temos de compreender primeiro um pouco melhor o mecanismo de promoção e manutenção da obesidade. A regulação do peso corporal é uma necessidade primitiva do ser humano. É algo tão inato e fundamental como a regulação da temperatura corporal ou da frequência cardíaca.
Um organismo que não é capaz de adaptar o seu gasto energético ao ambiente, nomeadamente aos períodos de carência, está destinado a falhar. Durante a maioria das gerações da espécie humana, em que o acesso aos alimentos era difícil e esporádico, foram selecionadas uma série de características associadas a uma eficaz regulação do peso e da adiposidade corporal. Assim, cada indivíduo está permanentemente em equilíbrio, relativamente aquilo que é determinado pelo seu metabolismo. A isto chama-se teoria do set-point metabólico. Cada indivíduo tem um alvo de peso corporal que é seu e “independente” de fatores externos. O nosso organismo possui complexos mecanismos de regulação para preservar esse set-point, o que significa que após uma perda de peso, a tendência será recuperar o peso perdido e, muitas vezes, ultrapassá-lo de forma a “preservar” a capacidade de sobrevivência.
A generalidade dos tratamentos para redução do peso baseia-se numa teoria de que o peso corporal vai diminuir se o consumo energético for inferior ao gasto. Assim, diminuindo o aporte calórico (com dieta restritiva) ou aumentando o gasto energético (com exercício físico), vamos conseguir reduzir o peso corporal. Esta teoria tem tanto de sedutor como de insuficiente. Cerca de ¾ de toda a energia gasta pelo nosso organismo serve para manter as células em funcionamento, a chamada “taxa de metabolismo basal”. Perante uma ameaça externa (como a diminuição do aporte ou a necessidade de gasto através do exercício), o organismo vai diminuir esta taxa de metabolismo basal, resultando numa adaptação metabólica e num estado de poupança energética. Isto vai permitir a recuperação do peso perdido, mesmo mantendo a restrição calórica ou o gasto “extra” do exercício.
Para atingir sucesso a longo prazo no tratamento da obesidade não é suficiente diminuir o peso, mas antes regular o set-point metabólico. É necessário alterar o alvo de equilíbrio determinado pelo organismo, de forma que este não tente contrariar a perda de peso nem recuperar o peso perdido.
Surge então a necessidade de alterar o ambiente hormonal responsável por este set-point metabólico. O problema surge porque a interação entre as diversas componentes deste sistema não é ainda completamento conhecida. No entanto, sabemos atualmente que, quer o tratamento farmacológico, quer o tratamento cirúrgico, conseguem interferir nos centros de regulação do apetite, da saciedade e da regulação energética, conseguindo perdas de peso sustentadas no tempo de uma forma que parece “natural” para o doente, porque finalmente deixa de ter de lutar contra a sua biologia.
Torna-se então claro que a sabedoria popular tem um fundo de verdade e que o mais difícil será convencer o organismo a tolerar a perda de peso e a manter um equilíbrio mais saudável a longo prazo.
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