![Enging: A engenharia da antecipação energética que quer transformar Portugal num hub tecnológico global [vídeo]](https://homepagept.web.sapo.io/assets/img/blank.png)
No rescaldo do recente apagão que afetou partes significativas da Europa, as atenções voltaram-se — com razão — para a resiliência e a inteligência da infraestrutura elétrica. Numa conversa no mais recente episódio do Coffee Break, Marco Ferreira, Diretor-Geral da Enging, empresa portuguesa sediada em Coimbra, defendeu que a digitalização da rede elétrica global é não só inevitável como urgente. E alertou: “Estamos ainda longe de uma monitorização em tempo real que permita decisões eficazes ao milissegundo.”
A Enging, adquirida em 2023 pelo grupo brasileiro Dynamox, posiciona-se como um dos atores mais relevantes na manutenção preditiva de ativos elétricos — transformadores, motores e geradores — com atuação em setores críticos como energia, petroquímica, águas, papel, cimento e renováveis. A sua tecnologia distingue-se por integrar um modelo matemático de análise antes mesmo da camada de inteligência artificial, o que, segundo Marco Ferreira, “garante uma fiabilidade incomparável e evita falsos alarmes”.
Um apagão que expôs fragilidades
Questionado sobre a utilidade da manutenção preditiva num cenário como o do apagão recente, Marco Ferreira foi direto: “O problema esteve na rede, não nos ativos. Mas este tipo de eventos reforça a necessidade de digitalização profunda das infraestruturas.” A Enging propõe-se exatamente a isso — antecipar falhas críticas e evitar paragens não planeadas, não só nas utilities, mas em toda a cadeia produtiva.
O seu diferencial técnico assenta numa recolha de dados a velocidades de até 100.000 pontos por segundo, permitindo reconstruir em detalhe a “onda elétrica” das máquinas. “Não monitorizamos variáveis secundárias — vamos ao sangue da máquina”, explicou Marco Ferreira, sublinhando a importância de dados fiáveis e de alto detalhe para a antecipação precisa de falhas.
IA com propósito industrial
Numa era de soluções plug-and-play de inteligência artificial, a Enging aposta num caminho mais profundo. “Não nos limitamos a aplicar IA sobre dados brutos. Primeiro, modelamos o comportamento da máquina matematicamente. Só depois a IA entra, oferecendo manutenção prescritiva baseada em histórico e contexto.”
Este modelo permite, por exemplo, identificar falhas não detetadas em testes offline — como aconteceu recentemente numa cimenteira africana, onde um motor foi diagnosticado como funcional por testes tradicionais, mas a Enging identificou uma anomalia dinâmica que se confirmou após intervenção preventiva.
A manutenção preditiva tem impacto direto na eficiência energética, uma preocupação crescente no setor industrial europeu. “Máquinas degradadas consomem mais energia. Nós “não só identificamos falhas, como quantificamos o desperdício energético — em quilowatt-hora e em euros”, referiu Marco Ferreira. Esta métrica é um argumento crescente junto de gestores financeiros e de sustentabilidade.
Um dos desafios críticos para qualquer solução tecnológica industrial reside na integração com os sistemas existentes, muitas vezes fechados e proprietários. A Enging, por sua vez, nasceu “API-first”, com dados abertos e prontos para integração via RESTful API — uma abordagem que visa reduzir fricções com ERPs, sistemas SCADA e plataformas de manutenção.
Apesar de operar com empresas portuguesas, a Enging desenhou o seu modelo de negócio com vocação internacional desde o início. “Portugal é pequeno. Desde 2011 que olhamos para fora.” Atualmente, está presente na Europa do Sul, Brasil, América Central, América Latina e dá os primeiros passos no Médio Oriente e África. A aquisição pela Dynamox veio reforçar essa ambição com sinergias tecnológicas e comerciais.
Um dos pontos mais estratégicos destacados por Marco Ferreira prende-se com a capacidade de Portugal se tornar um hub de inteligência aplicada à manutenção industrial. A Enging já opera um centro de monitorização remota a partir de Coimbra, com contratos ativos que permitem antecipar falhas à distância. “Queremos que os clientes olhem para Portugal e vejam excelência tecnológica”, afirma, com a ambição de que o país se posicione como fornecedor global de soluções industriais críticas.