O crédito ao consumo tem um papel preponderante na economia, não só porque permite financiamento e a realização de projetos pessoais, como permite o acesso a bens para os quais não existe disponibilidade imediata para a sua aquisição, diluindo-se o seu pagamento no tempo. É igualmente um elemento essencial do financiamento da economia, impulsionando as vendas e o desenvolvimento económico, servindo como suporte à economia, contribuindo para o crescimento económico do país.

2024 foi um ano de crescimento do crédito concedido, tendo o crédito automóvel representado a maior fatia de valor emprestado a consumidores. Embora o 1º trimestre tenha sido de redução nos veículos novos (e apenas destes), o resto do ano foi de evolução positiva, tanto relativamente aos trimestres anteriores, como na comparação homóloga. É ainda de notar, no crédito automóvel, que foi mais acentuada a evolução dos veículos novos do que dos veículos usados, embora em volume os segundos superem os primeiros. Já relativamente ao crédito pessoal, os dois primeiros trimestres foram de redução, tanto comparando com o trimestre anterior, como na comparação homóloga, recuperando em ambas as perspetivas a partir do 3º trimestre. O mesmo comportamento verificou-se nos novos contratos de cartões de crédito.

Ora, este aumento é perfeitamente natural, por diversas razões. A primeira, fruto da inflação: se os preços aumentam, também o montante dos créditos para aquisição dos produtos e serviços terá que aumentar; a segunda, devido ao aumento da confiança dos consumidores, que vendo alguma estabilização sociopolítica, colocam em prática as suas decisões de investimento/aquisição de bens necessários; a terceira, devido ao emprego (e baixo desemprego), que permite uma maior capacidade de contrair créditos; por último, a quarta razão, a estabilização das taxas de juro do crédito à habitação, que sendo variáveis, e o principal e mais elevado encargo das famílias, ao verificar-se uma estabilização ou redução das taxas e consequentemente das prestações do crédito à habitação, a taxa de esforço reduz-se, permitindo ter acesso mais seguro ao crédito ao consumo. Note-se que, sendo os créditos ao consumo com taxa fixa, a subida das taxas de juros (BCE/ Euribor) não prejudicou de qualquer forma a prestação dos créditos ao consumo contratados, suportando as instituições associadas da ASFAC essa diferença.

2024: Ano de resiliência

2024 foi um ano de esforço, mas de grande resiliência dos associados da ASFAC, que mantiveram o seu percurso de apoio aos consumidores, à economia e ao tecido empresarial. Foi um ano de saudável colaboração com o Governo e com o regulador (Banco de Portugal) e de equilíbrio a nível legislativo com impacto no crédito ao consumo, tendo sido publicados alguns diplomas, resultantes de um salutar diálogo prévio e de encontro de soluções conjuntas.

Sem um ambiente legislativo saudável e equilibrado, sem colaboração interinstitucional, sem um regime fiscal justo, o crédito ao consumo não se poderá desenvolver de forma saudável, e sem o crédito ao consumo, os comerciantes, desde os mais pequenos aos maiores, não sobreviverão e os consumidores, sendo os motores da economia, não terão acesso aos bens que necessitam para viver e ter qualidade de vida!

No entanto, há um fator essencial na relação de crédito ao consumo: a utilização e concessão de crédito responsável. Esta responsabilidade recai sobre as instituições e sobre os consumidores: uns devem saber quando podem ou devem pedir um crédito, devem saber o que estão a fazer, conhecer o produto, as regras, as obrigações e os direitos, devem pesquisar o mercado, e optar pela melhor solução; os outros, as instituições, devem fazer uma análise criteriosa do cliente, avaliar as sua capacidade financeira, informá-lo com detalhe dos termos do contrato, das suas responsabilidades e dos seus direitos, devem ainda acompanhar o cliente durante todo o período do contrato, alertando-o sempre que exista algum risco informando-o dos desenvolvimentos do seu contrato e encontrando soluções em caso de dificuldades.

Ora, esta foi uma receita que tem sido aplicada e tem resultado. Vejamos: durante o ano de 2024, a média dos rácios de empréstimos ao consumo vencido foi de 2,67%, variando entre um máximo de 2,8% e um mínimo de 2,6% (por curiosidade, em 2023 a média foi de 3,15%, em 2022 de 3,84%, em 2021 de 5,35% e em 2019, antes do Covid 19, foi de 7,03%) – nota-se aqui uma forte evolução positiva dos contratos de crédito ao consumo vencidos. Esta constante evolução reflete também a taxa de esforço dos clientes: no 1º semestre de 2024 o DSTI (Debt Service to Income – responsabilidades de crédito face aos rendimentos da família) foram de 26,3%, uma taxa muito confortável para as famílias, abaixo de 2023 (26,7%), embora ainda acima dos 23% e 24% de 2021 e 2022, justificado pelo período de taxas de juro historicamente baixas, onde o impacto da prestação do crédito à habitação era menor do que nos últimos dois anos.

2025: Crédito ao consumo com perspetivas positivas

Para 2025, as perspetivas para o crédito ao consumo são positivas. Por um lado, a previsão de uma descida das taxas de juro por parte do BCE, como previsto, poderá permitir um maior acesso ao crédito. Por outro lado, a incerteza em relação ao cenário económico e político internacional, nomeadamente as decisões a serem tomadas com a nova administração dos Estados Unidos e os desenvolvimentos bélicos, poderá influenciar negativamente a confiança dos consumidores e a sua propensão para contrair crédito.

O ano de 2025 será marcado pela alteração do regime do crédito aos consumidores, através da transposição para o nosso ordenamento jurídico da Diretiva 2023/2225 do Parlamento Europeu e do Conselho, que regula os contratos de crédito aos consumidores.

Esta Diretiva acompanha na quase totalidade o atual regime vigente em Portugal, que aliás serviu de base a diversas disposições. Por essa razão, e por já termos tido no nosso país um regime mais exigente que o dos restantes players europeus, criando um ‘level playing field’ desfavorável para as instituições portuguesas, é imprescindível, que a bem do mercado português e de uma saudável concorrência, a transposição decorra de uma adaptação fiel e sem tentativas de ir para além do previsto pelo legislador europeu, pois o resultado será um prejuízo para o sistema financeiro português e um contágio ao tecido económico nacional e aos consumidores.

Adicionalmente, é essencial que todas as instituições financeiras adotem práticas de concessão de crédito responsáveis, avaliando cuidadosamente a capacidade de endividamento dos clientes e evitando o sobre-endividamento. Da mesma forma, os consumidores devem utilizar o crédito de forma consciente e informada, planeando cuidadosamente os seus orçamentos e evitando comprometer as suas finanças pessoais. Para isso, precisamos em conjunto de impulsionar uma melhoria constante da literacia financeira em Portugal.

Em suma, vejo 2025 como um ano de continuidade do desenvolvimento sustentado do crédito aos consumidores, enquanto importante motor da economia portuguesa, o que levará ao crescimento do país e melhoria da qualidade de vida dos portugueses.