A vida turca de José Mourinho segue agitada, conflituosa. Pela primeira vez desde 2004, o português está a treinar fora das big 5, as cinco principais ligas do futebol europeu, compostas por Espanha, França, Itália, Inglaterra e Alemanha. Mas isso não traz um treinador mais conformado, mais calmo, mais relaxado.
Antes pelo contrário. Os monólogos turcos do técnico são uma das constantes da temporada. À medida que a diferença para o Galatasaray vai aumentando, o líder da equipa da parte asiática de Istambul vai subindo o tom da crítica.
Para Mourinho, o “sistema” do futebol turco alinha-se a favor do Gala e contra o Fener. Tem-no defendido em várias ocasiões, apontando a arbitragem — e os erros a favor do seu adversário e contra a sua equipa — como motor desse “sistema”. Voltou a ser assim depois da vitória, por 2-1, contra o Hatayspor.
Qual cavaleiro solitário, andando e combatendo sozinho a injustiça que quer denunciar ao mundo, José Mourinho começou por disparar na entrevista rápida. Nestas ocasiões, dá-se uma curiosa sequência, com perguntas em turco, traduções para inglês, respostas em inglês e tradução para turco.
O special one questionou diretamente o jornalista: “Tens medo de dizer a verdade porquê? Perguntas-me isto e tentas esconder a verdade porquê? Nestes país as pessoas têm medo do quê? Acham que a diferença de pontos é só a diferença de futebol jogado? Digam a verdade! Não me perguntem”, instou Mourinho.
Em segundo na tabela da liga turca, o argumentário do português não fugiu ao que tem sido habitual. O Fenerbahçe tem 16 vitórias, seis empates e cinco derrotas em 27 partidas na temporada, estando a oito pontos do Galatasaray. Apesar de ter 19 títulos de campeão, o Fener não vence a liga desde 2013/14.
Na conferência de imprensa, José Mourinho prosseguiu a sua cavalgada solitária contra o que define como “o sistema”. O sistema é algo como o setubalense “nunca viu” em “25 anos como treinador e 35 no futebol”: “Tem uma dimensão superior a qualquer coisa imaginável e não acho que seja uma situação em que um clube, sozinho, consiga destruir um sistema muito forte que está montado”, opinou.
Nestes monólogos turcos, Mourinho embala e ninguém o trava. As frases vão, apenas, sendo interrompidas pelas pontuais traduções. O português não fala turco mas diz que, depois de assistir à derradeira vitória do Galatasaray, aprendeu a palavra skandal, isto é, “escândalo”. “Acho que, neste país, muitas pessoas gostam disso. Até os vencedores gostam, que é a pior coisa. Ganhar a qualquer custo e ganhar desta forma é a pior coisa”, atirou.
Aos 61 anos, Mou descreve o ambiente no futebol turco como “tóxico”. Frente ao Hatayspor, num triunfo que se seguiu ao empate (1-1) contra o Eyupspor, o português contou três expulsões perdoadas ao seu adversário, na sequência dos dois vermelhos que entende terem sido perdoados ao opositor na partida anterior.
“Os adversários sabem como podem jogar contra nós e como não podem jogar contra os nossos rivais”, disparou o cavaleiro solitário, que acredita que o Fenerbahçe vai ganhar jogos, porque “irá melhorar” enquanto equipa, mas questiona “como é que eles [Galatasaray] vão perdoar pontos?”, deixando no ar que o tal “sistema” impede que os bicampeões escorreguem.
Tentando ganhar apoio para a sua luta, José Mourinho recordou que a liga turca é a sua liga, porque é onde trabalha, mas tentou ganhar adeptos locais para a causa: “É a vossa liga, é a liga de cada criança que sonha ser futebolista. Se estão felizes com este status quo, sejam felizes.” E lá terminou mais um monólogo turco.