Trinta graus, uma ameaça (concretizada) de tempestade, um estádio quase vazio, uma equipa amadora e outra sem saber a quantas anda: aqui está montado o cenário para um belo treino de pré-época. Mas não, estamos no Mundial de Clubes, a prova que a FIFA nos quer fazer crer que um dia será o pináculo do futebol de clubes.

O Benfica-Auckland City demorou uma eternidade. Na prática, demorou uma eternidade depois de uma paragem de mais de duas horas por causa de um extremamente floridiano fenómeno meteorológico. E figurativamente, tal a pobreza competitiva do embate, de ambas as partes, diga-se, que nem a vitória por 6-0 do Benfica consegue disfarçar. Uma eternidade também será necessária para explicar porque é que um treinador e um jogador discutem e apontam o dedo um ao outro em pleno jogo e, spoiler alert, não foi a equipa amadora a oferecer este lindo momento.

Mas voltemos ao jogo.

Alex Grimm

Antes da comporta da barragem dos golos abrir, muito graças à falência física da rapaziada neozelandesa e da entrada de pulmões novos na única equipa profissional em campo, durante quase uma hora o Benfica pareceu, demasiadas vezes, aquilo que o adversário é: um conjunto de valorosos amadores que se juntam ao final da tarde para treinar. A fragilidade do Auckland City nem obrigava a um esforço coletivo hercúleo, mas até frente à equipa mais frágil da competição convém apresentar mais ideias para lá de bola em Di María, cruzamentos para a área e uma velinha a um qualquer santo.

Assim foi a 1.ª parte do Benfica, onde os encarnados até permitiram àqueles fiéis de armazém, vendedores de Coca-Cola e estudantes universitários alguns períodos com bola, talvez um presente por muitos deles estarem ali a gastar os seus dias de férias, talvez um sinal de que o próprio Benfica já queria há muito estar de férias.

Houve, naturalmente, oportunidades para os encarnados. Aos 20’, Aktürkoglu rematou rente ao mesmo poste que uma bola de Pavlidis foi encontrar quatro minutos depois. O pequenito Prestianni, pela primeira vez titular com Bruno Lage, ficou perto do golo num inusitado remate de cabeça já perto do intervalo, altura em que o guarda-redes Garrow até parecia um profissional com anos e anos de labor entre os postes. Só de penálti o Benfica conseguiu abanar o marcador.

As mais de duas horas de paragem pouco terão servido para mudar a abordagem. Aliás, é do Auckland City, que na 1.ª parte foi tentando a sua sorte com passes verticais e correrias dos extremos, o primeiro remate com perigo, com o Benfica a aumentar a vantagem aos 53’, na primeira vez em que o seu jogo interior funcionou: Kökçü encontrou Pavlidis, que trabalhou bem em cima dos adversários antes de rematar.

O golo não travou o ímpeto do Benfica em abusar nos cruzamentos e Kökçü, como prenda pela sua criatividade, foi substituído por Renato Sanches, dando azo a um bonito momento de indisciplina para meio mundo ver. Quando o médio português marcou num remate de meia-distância logo após cheirar o campo, foi Lage a tirar de esforço com o seu jogador. Tudo extremamente saudável.

Michael Owens

O 3-0 acabou com a resistência física do Auckland City e a vantagem do Benfica foi engordando com naturalidade. Leandro Barreiro justificou a sua presença em campo com dois golos, duas boas entradas na área para responder a cruzamentos, porque pouco mais justificará a aposta no luxemburguês num jogo como este. Di María, de penálti, fecharia a contagem numa meia-dúzia pouco merecida pela equipa neozelandesa, que se bateu como pôde, montando bem as suas linhas defensivas na 1.ª parte e aguentando o mais possível após a paragem.

Os seis golos poderão ajudar e muito o Benfica na caminhada para a fase seguinte. Mas são seis golos que não contam toda a história de um jogo geralmente fraco, desinteressante e que para mais expôs mais uma vez as dificuldades de organizar um torneio em plena época de tempestades elétricas. Já é o quarto jogo do Mundial de Clubes interrompidodevido a fenómenos meteorológicos extremos, seja chuva, trovoada ou calor. É o que nos esperará no próximo ano, em pleno Mundial de seleções, muito mais visto, muito mais importante que este Mundial de Clubes.