
"Muitas pessoas pensam em comida constantemente, mesmo quando não estão com fome. Isso tem um nome: ruído alimentar", começa por explicar Riccardo Dalle Grave, chefe do Departamento de Transtornos Alimentares e de Peso do Hospital Villa Garda, em Itália, ao Psychology Today.
De acordo com um artigo recente elaborado pela professora Emily J. Dhurandhar, da Universidade do Indiana, o ruído alimentar define-se como: "Pensamentos persistentes sobre comida percebidos pelo indivíduo como indesejados e/ou disfóricos, que podem causar sofrimento ou dificuldade".
Segundo essa definição, não se trata apenas de se perguntar o que jantar - é uma ruminação mental constante, opressiva e stressante, difícil de interromper.
Recentemente, o ruído relacionado com a comida atraiu a atenção tanto do público em geral como da comunidade científica, especialmente porque muitas pessoas que tomam medicamentos para a obesidade, como agonistas do receptor GLP-1, relatam que um dos benefícios mais significativos não é apenas a perda de peso em si, mas também o silenciamento daquele zumbido mental implacável em relação à comida. Alguns descrevem isso como se uma parte do cérebro finalmente se tivesse acalmado.
Ruído alimentar não é o mesmo que fome ou desejos. A fome é um sinal físico normal para o controlo homeostático do equilíbrio energético humano. Desejos vêm e vão, e são determinados pelo gosto e desejo de controlo hedónico da ingestão de alimentos. O ruído alimentar, por outro lado, é como um zumbido de fundo constante: sempre presente, constantemente perturbador. É como ter um rádio na cabeça que fala sobre comida sem parar - mesmo que nunca o tenha ligado e não o consiga desligar.
Essa condição pode ser exaustiva. Pessoas que a vivenciam relatam dificuldade em tomar decisões alimentares, preocupação constante com calorias ou nutrientes, ou distração com pensamentos recorrentes sobre o que comer a seguir. Alguns sentem-se frustrados ou culpados pelo espaço mental que a comida ocupa. Pode afetar a capacidade de concentração, reter informações, desfrutar de momentos sociais, ler um livro ou assistir a um filme.
O que causa o ruído alimentar
Os investigadores ainda não têm todas as respostas, mas acredita-se que o ruído alimentar esteja ligado a mecanismos cerebrais e hormonais, especialmente durante tentativas de perda de peso ou dietas restritivas e extremas. Por exemplo, durante uma dieta, o corpo pode aumentar as hormonas da fome (como a grelina) e diminuir os hormonas da saciedade (como o GLP-1), fazendo com que a mente se concentre ainda mais na comida. Novos medicamentos para a obesidade, particularmente os agonistas do receptor de GLP-1, parecem atenuar esses mecanismos.
Reconhecer que o ruído alimentar tem raízes biológicas pode ajudar a aliviar a culpa frequentemente sentida por indivíduos que o vivenciam durante uma dieta. Não é uma questão de força de vontade. Ver dessa forma pode aumentar o stress e os sentimentos de vergonha.
O nosso ambiente também desempenha um papel significativo. Estamos constantemente expostos a propagandas de alimentos, conselhos sobre dietas, tendências de saúde e pressões sociais para comer "perfeitamente" e atingir padrões corporais específicos. Tudo isso contribui para amplificar o ruído alimentar. Estar ciente dessas influências externas pode ajudar a distinguir as necessidades corporais reais do "ruído" ambiental.
O que pode ajudar
Além dos medicamentos GLP-1 para o controlo da obesidade, atualmente não existe uma solução universal para o ruído alimentar. No entanto, alguns tratamentos psicológicos, como terapia cognitivo-comportamental e técnicas de mindfulness, podem ajudar a pessoa a aprender a gerir e a reformular a sua relação com os pensamentos relacionados com a comida.
Também é essencial evitar abordagens alimentares disfuncionais que envolvam regras extremas, como saltar refeições, eliminar grupos alimentares inteiros ou seguir dietas de baixíssimas calorias. Se o ruído alimentar interfere no bem-estar diário, é essencial consultar um profissional de saúde, especialmente um com experiência em transtornos alimentares.