Num setor onde os algoritmos e a automação ocupam cada vez mais espaço, a Foundever, multinacional de outsourcing de serviços ao cliente, aposta num equilíbrio delicado: alavancar a inteligência artificial sem abdicar do valor humano. Cátia Moreira, vice-presidente de performance para a região multilingue da empresa, defende com convicção que “ninguém vai querer, no futuro, fazer trabalho repetitivo que uma máquina pode substituir”. Ainda assim, frisa, “o fator humano continuará a ser essencial”.

A executiva, que começou a sua carreira na linha da frente como assistente de apoio ao cliente, é hoje uma das responsáveis pelo desenho e implementação de soluções que combinam tecnologia e empatia humana. A sua ascensão dentro da empresa não foi marcada por barreiras explícitas de género, garante. “Não senti que tivesse mais dificuldades por ser mulher. O talento e a entrega falaram por si”, diz, numa rara recusa da narrativa de desigualdade habitual nos cargos de topo da tecnologia.

A Foundever, com operações globais e foco em experiência do cliente, responde diariamente a desafios de marcas internacionais em diversos setores. A região sob responsabilidade de Cátia é designada como “multilingue” — um conceito que vai além da geografia, refletindo a complexidade cultural e linguística da operação.

IA sim, mas com supervisão humana

Num momento em que as empresas procuram reduzir custos e acelerar processos através da automação, a Foundever mostra-se cautelosa. “A inteligência artificial tem trazido ganhos claros, como uma melhoria média de 11% no tempo de atendimento, mas os nossos colaboradores continuam a ter um papel decisivo”, afirma.

Esses ganhos são particularmente evidentes nas tarefas repetitivas, libertando os operadores para funções mais analíticas e relacionais. Ainda assim, reconhece, “a IA pode falhar” — um ponto sensível que a empresa endereça com sistemas de supervisão humana prontos a intervir quando necessário. “Há sempre um momento de decisão em que o colaborador pode assumir o controlo do contacto”, explica.

Os sistemas de IA utilizados pela Foundever são, em grande parte, desenvolvidos internamente, com o apoio de parceiros tecnológicos como a AWS. Mas a dependência é controlada: “Temos vindo a construir as nossas próprias soluções, mesmo com parceiros, o que garante maior autonomia e segurança”.

O custo da inovação

A questão do custo das soluções de IA — frequentemente apontada como barreira à adopção — ainda não se tornou um problema para a Foundever. “O mercado exige estas soluções. Não há alternativa. Mas temos contornado os custos mais elevados, sobretudo quando a IA interage diretamente com o cliente, através de abordagens híbridas e desenvolvimentos internos”, diz.

A empresa opta por aplicar a tecnologia em bastidores, onde o risco de falha é menor, deixando o contacto direto ao critério dos humanos — uma escolha que reduz custos de licenciamento e aumenta o controlo sobre a experiência do utilizador.

Dados: o novo capital

Num ecossistema baseado em dados, a sua proteção e governação são elementos críticos. A Foundever, que trabalha com dados de terceiros em nome das marcas que representa, implementa rigorosos mecanismos de compliance. “Temos uma equipa dedicada exclusivamente à proteção de dados. Todos os processos são auditados e cumprem os regulamentos europeus em vigor”, assegura Cátia Moreira.

A parceria com a AWS fornece não apenas infraestrutura cloud, mas também um conjunto de ferramentas de segurança e conformidade. No entanto, a executiva sublinha que “a responsabilidade não é só do fornecedor; é também nossa. E é assim que tem de ser”.

Pensar além da tecnologia

A formação de Cátia Moreira foge ao currículo tradicional da indústria: licenciatura em Educação Social, mestrado em Psicologia e diversas certificações técnicas posteriores em áreas como data analytics e qualidade. Esse percurso multidisciplinar reflete uma visão cada vez mais valorizada na gestão moderna: a tecnologia é poderosa, mas é nas humanidades que se formam os líderes capazes de a aplicar com discernimento.

“Acredito que liderar equipas exige conhecimento técnico suficiente para compreender o trabalho dos outros, mas também competências humanas para criar valor real”, resume.

Numa era em que muitos gestores apostam tudo na automação, a Foundever segue uma estratégia mais ponderada: usa a inteligência artificial como ferramenta, não como substituto. E coloca os seus colaboradores no centro da operação, com o apoio da tecnologia — não o contrário.