No início do mês, na conferência de imprensa que encerrou a Cimeira da Nato em Washington, Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, afirmou que “que a China não pode continuar a alimentar o maior conflito militar da Europa sem que isso não afete os interesses de Pequim". Stoltenberg acusou a China de ser um "facilitador decisivo" da guerra da Rússia contra a Ucrânia. O secretário-geral da NATO realçou que a parceria ilimitada entre Pequim e Moscovo tem permitido um robusto apoio à base industrial de defesa russa. Jens Stoltenberg disse ainda que a aliança China-Rússia não só mantém a economia russa a funcionar como também garante a capacidade de Moscovo para continuar a sua ofensiva na Ucrânia durante muitos anos.
As acusações da NATO não podiam ter sido mais assertivas e impactantes. As declarações do secretário-geral da NATO dissiparam quaisquer dúvidas acerca da visão da NATO relativamente ao apoio decisivo da China à Rússia na ofensiva militar na Ucrânia.
Até agora imperava uma certa ambiguidade na avaliação da comunidade internacional ao papel chinês na crise ucraniana.
Por exemplo, ainda em abril, o Financial Times referia que a "amizade" entre China e Rússia podia não ser tão sólida como aparentava, sugerindo que a relação entre os dois países não seria consistente e que a Rússia se tinha visto obrigada a voltar-se para o Oriente depois de fevereiro de 2022 e das sanções que lhe foram sendo impostas.
O Financial Times apresentava, inclusivamente, alguns dados comparativos para reforçar a tese da relação pouco consistente entre China e Rússia. Referia o Financial Times que o PIB nominal da Rússia se situava entre o do Brasil e o da Austrália e que os volumes de comércio entre a China e estes três países seriam aproximadamente equivalentes.
É certo que as importações da China provenientes da Rússia representam apenas 5% do total das importações chinesas, o que é um número com muito pouca expressão.
No entanto, as exportações chinesas para a Rússia cresceram cerca de 47% em 2023, um aumento impressionante e o maior entre os parceiros comerciais da China. Este crescimento substancial nas exportações da China para a Rússia inclui equipamento e ferramentas vitais para a expansão militar russa. O The Guardian, citando fontes norte-americanas, relata que mais de 70% da despesa russa em equipamento e ferramentas no último trimestre de 2023 resultou de importações da China. Refere o The Guardian que todo este material serviu, provavelmente, para produzir mísseis balísticos. Depois, já com referência à totalidade do ano de 2023, 90% das importações de componentes microeletrónicas da Rússia, usados para produzir mísseis balísticos, tanques e aeronaves, também tiveram proveniência da China.
Portanto, a ambiguidade da comunidade internacional em relação à consistência das relações comerciais entre Rússia e China é agora totalmente desmantelada pela NATO. A NATO sublinha de forma perentória o papel da China enquanto "facilitador decisivo" da guerra na Ucrânia. A NATO eleva, inclusivamente, a fasquia da “guerra fria” Nato-China em curso, ao considerar, de forma mais ou menos explícita, a possibilidade de aplicação de sanções económicas contra Pequim. Ver-se-á como evolui esta “guerra” a partir de agora. Depois da conferência de imprensa no final da Cimeira da NATO em Washington, a previsão não é animadora.
Economista e professor universitário