
O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2024 revelou uma redução de 4,6% na criminalidade geral em Portugal, colocando os números ao nível pré-pandemia. No entanto, o mesmo documento assinala uma subida preocupante nos crimes violentos e na delinquência juvenil, além de reforçar alertas sobre tráfico de droga, violência doméstica e ameaças extremistas. A análise foi entregue à Assembleia da República em abril e contou com o contributo de 25 entidades, entre as quais PSP, GNR, PJ, SIS e SEF.
Segundo o RASI 2024, foram registadas 354.878 participações criminais, menos 17.117 do que em 2023, confirmando o primeiro recuo desde 2019. Esta inversão surge após três anos consecutivos de aumento, marcando uma viragem significativa na tendência criminal. A criminalidade geral caiu, mas os crimes violentos subiram 2,6%, totalizando 14.385 ocorrências, representando a menor subida anual dos últimos dez anos.
Entre os crimes que mais cresceram destacam-se roubos por esticão (+8,7%), furtos de viaturas (+106,3%), roubos em estabelecimentos comerciais (+21,7%), violações (+9,9%) e assaltos a bancos ou caixas automáticas (+128,6%). Em contrapartida, houve quebras nos crimes contra agentes de autoridade (-16,2%), em ofensas à integridade física grave (-6,1%), roubos na via pública (-0,3%) e furtos diversos (-8,3%).
O número de homicídios fixou-se nos 89 casos, menos um do que em 2023, mantendo-se abaixo da média da última década. Desses, 23 foram em contexto de violência doméstica, um dado que continua a preocupar as autoridades. A violência doméstica caiu ligeiramente (-0,8%), mas os 30.221 casos registados demonstram persistência estrutural do problema, com um agravamento particular nos casos envolvendo menores (+7,2%).
A delinquência juvenil voltou a aumentar, com uma subida de 12,5% nas faixas etárias dos 12 aos 16 anos. O fenómeno tem-se tornado mais violento e mediático, sobretudo em contextos de grupo e recorrendo a armas brancas. A criminalidade grupal subiu 7,7%, com relatos de agressões motivadas por razões fúteis. Em muitos destes casos, os autores são jovens entre os 15 e os 25 anos.
Apesar das estatísticas detalhadas, o Governo optou por manter a omissão de dados por nacionalidade e género, restringindo essa informação ao sistema prisional, onde os estrangeiros representavam 17,4% da população reclusa em 2024, um aumento de 5,6% face à última década. Esta decisão gerou polémica no Parlamento, com alguns partidos a exigirem mais transparência.
No sistema prisional, o número de reclusos subiu para 12.360 (+2,4%), e as agressões a guardas prisionais aumentaram, com 42 agentes atacados em 2024. A taxa de ocupação das prisões manteve-se nos 96,8%, sem sinais de superlotação.
O tráfico de droga registou uma quebra de 28,3% nas participações criminais, mas as apreensões de heroína (+127,7%) e ‘ecstasy’ (+138,3%) aumentaram substancialmente, apontando para alterações nos padrões de consumo e nas rotas utilizadas pelas redes internacionais. As autoridades admitem que os grupos organizados adaptam-se e a operar com mais violência.
No plano das ameaças à segurança pública, o relatório alerta para o crescimento da radicalização juvenil e da propaganda extremista, sobretudo no meio digital. Um dos casos mais graves foi a operação “Desarme 3D”, que este ano desmantelou o Movimento Armilar Lusitano, um grupo de extrema-direita armado, com seis detidos e centenas de armas e explosivos apreendidos.
A nível legislativo, prosseguem os debates sobre o reforço penal para crimes como violação e violência doméstica, bem como a necessidade de formação especializada para os agentes de segurança. O relatório destaca ainda a urgência em combater a desinformação e os radicalismos online, com apelos à promoção da literacia mediática.
Em matéria de imigração ilegal, os crimes caíram 29,6% (343 casos), o valor mais baixo em 10 anos. Ainda assim, o número de estrangeiros expulsos subiu para 387, mais 117 que no ano anterior.
O RASI de 2024, aprovado pelo Conselho Superior de Segurança Interna, servirá de base estratégica para futuras políticas públicas de segurança, nomeadamente no combate à criminalidade juvenil, violência doméstica, terrorismo e tráfico de droga. As autoridades reforçam que os dados devem ser usados para consolidar uma abordagem integrada e preventiva, alinhada com a Estratégia Nacional de Segurança Interna.